sábado, 24 de novembro de 2012


RUTH DE AQUINO

Pelo fim dos salários extras dos senadores

Excelentíssimos senadores. Tomem vergonha e paguem o imposto devido à Receita Federal sobre o 14º e o 15º salários que os senhores vêm recebendo à custa de um tratamento imoral desta nossa República, onde uns são mais iguais do que outros. Não passem sua dívida para os contribuintes. Nós só temos direito, quando muito, ao 13º salário.

Não acreditem nos aduladores que os chamam de “homens incomuns”. Os senhores deveriam se orgulhar de ser comuns, no cumprimento às leis. Deveriam recusar mordomias incompatíveis com o serviço público. Os senhores nos representam na Câmara Alta? Deem então o exemplo – a seus filhos e à nação. Não se finjam de tolos, porque tolos não são. E não se esqueçam das multas e dos juros. Comemorem o fato de que a Receita só pode cobrar atrasados dos últimos cinco anos. Cuidado com o nome sujo na praça.

Em agosto, o Leão deu um prazo de 20 dias para Suas Excelências enviarem cópias de contracheques e comprovantes de rendimentos anuais. Foi um deus nos acuda. A cada ano, em valores atuais, um senador ganha R$ 53.400 extras, de 14º e 15º salários. Essa benesse foi criada em 1946.

Os senadores nunca recolheram imposto sobre isso. Agora, pressionados pela Receita e sob ameaça de uma investigação do Tribunal de Contas da União, cada senador terá de devolver aos cofres aproximadamente R$ 65 mil, fora juros e multas, relativos aos últimos cinco anos. Convenhamos: é muito pouco. Pouco para eles, bem entendido. Se imaginarmos que o mandato de cada senador custa R$ 33,1 milhões por ano ao país, segundo o site Transparência Brasil.

Eles ficaram revoltados. Embora sejam cultos e informados, os senadores pensavam que o 14º e o 15º salários eram só uma ajuda de custo, isenta de impostos. Incrível. Esses extras apenas se somariam a verbas que ajudam os senadores a sobreviver com estilo. Por fora do subsídio mensal, eles têm moradia paga, refeição paga, passagem aérea paga, telefone pago, combustível pago, assessor pago. Alguns têm até amante paga.

Na terça-feira passada, o Senado decidiu custear a dívida dos senadores. Com dinheiro público. Isso quer dizer que você e eu daremos uma mão aos parlamentares. Pagaremos os impostos devidos por eles. Além dos nossos, claro. Natural, num país em que a carga tributária é baixinha... Os senadores dispostos a pagar a dívida do próprio bolso deveriam comunicar à Casa sua intenção até o fim da sexta-feira, quando esta coluna era escrita. Seria útil divulgar a lista.

Você e eu ajudaremos a pagar os impostos devidos pelos parlamentares – além dos nossos, é claro

Sabemos da importância de um Legislativo forte numa democracia. Saudamos a independência entre os Poderes. Mas, por favor, senadores, mirem-se no Judiciário de Joaquim Barbosa. Ao tomar posse, Joaquim disse que o juiz deve guardar distância das “múltiplas e nocivas influências” – entre elas as políticas – para se manter independente.

Pediu que o juiz escute o “anseio” da sociedade e não se isole “numa torre de marfim”. Reconheceu o “deficit de Justiça” no Brasil, lamentou que nem todos os brasileiros sejam tratados “com igual consideração”.

Defendeu um Judiciário “sem firulas, sem floreios, sem rapapés”.

Traduzindo a fala de Joaquim para nossos 81 senadores. Mantenham sua independência sem relações espúrias com lobistas, laranjas, bicheiros e empresários. Ouçam a sociedade e não se isolem. Os eleitores estão cansados de maracutaias, de espírito corporativista e da ressurreição de fantasmas como Renan Calheiros.

Votem com a consciência, e não com a conveniência. Abram mão de privilégios de casta. Sem firulas, sem floreios, sem rapapés, ataquem o nepotismo e a corrupção na Casa. E paguem seus impostos, porque isso é o mínimo que se exige dos contribuintes.

Aproveito o imbróglio para lançar uma campanha mais radical – pelo fim dos 15 salários dos senadores. Não há justificativa, excelentíssimos. É por isso que, às vésperas do recesso de fim de ano, fica todo mundo rindo e fofocando. Já pensou tirar férias assim?

Existe um projeto que restringe os salários extras ao primeiro e ao último ano de mandato. Mas ninguém quer saber de votar – o texto deve estar nas gavetas empoeiradas dos porões do Congresso. Mesmo se fosse aprovado, continuaria sendo uma prática imoral.

Por que quem é pago por nós ganha dois salários a mais ao ano?

Presidente Dilma, com todo o respeito, não pegou bem seu rosto emburrado de tédio na posse de Joaquim Barbosa como presidente do STF. A senhora fez um gesto carinhoso e gentil, ao ajeitar a capa do ministro. Mas trancou a boca e o olhar, mostrou-se alheia ao clima nacional de alegria e comemoração.

Poderia ter ignorado as orientações e mostrado personalidade. Poderia ter-se colocado acima dos erros e das paixões. A senhora fica mais bonita quando sorri.