A má política de Mr. Musk
Elon Musk, dono do X, o antigo Twitter bloqueado na sexta-feira pela Justiça brasileira por descumprir a lei, gosta de arvorar-se como paladino da liberdade de expressão, enquanto, na verdade, está preocupado apenas em fazer política - a seu modo, imaginando-se acima dos marcos legais dos Estados nacionais.
Acusa o ministro Alexandre de Moraes e o Palácio do Planalto de censura, embora cumpra, com rigor - e principalmente em silêncio -, decisões de governos que lhe são simpáticos.
Os rompantes pela suposta liberdade de expressão que defende não são vistos em países como Turquia, Índia e Arábia Saudita - nesse último, aliás, a monarquia teocrática é uma das acionistas da plataforma.
Em 2023, o governo de Narendra Modi, na Índia, proibiu a exibição e menções na rede social de um documentário da rede BBC sobre a omissão das autoridades sobre uma revolta em Gujarat, que resultou na morte de mil muçulmanos, em 2002. O que fez Mr. Musk? Bloqueou perfis que indicavam o link do trabalho. Disse que "não poderia violar as leis do país". Tempos depois, na mesma nação que experimenta a deterioração da liberdade de expressão, acatou a ordem do governo para remover contas de jornalistas críticos ao presidente. Na Turquia de Recep Tayyip Erdogan, não é diferente.
Não soa estranho Musk fazer gritaria apenas contra governos e órgãos judiciais de blocos supranacionais ou países onde há consolidadas regras de regulação das redes sociais, como União Europeia, Reino Unido e Austrália? O Brasil engatinha para algo semelhante. Estranho Musk não se preocupar com as mensagens de ódio, o racismo, a desinformação, a pornografia e a apologia ao nazismo que pululam em sua plataforma. Não, o que ele faz não é lutar pela liberdade de expressão. É política. Má política. _
Kamala Harris esteve à vontade e suave em sua primeira entrevista. Kamala Harris, e seu candidato a vice, Tim Walz, concederam a primeira entrevista juntos desde a confirmação de seus nomes para a corrida eleitoral.
Kamala se mostrou firme, esteve suave e à vontade durante os 30 minutos de conversa com a rede CNN.
A vice-presidente nunca esteve "olho no olho" com Trump. Recentemente, o ex-presidente fez falas em que contestou a identidade da adversária, afirmando que ela se apresenta como "negra", mas que, antes das eleições, não se identificaria assim. Ela respondeu:
- O mesmo manual velho e cansado. Próxima pergunta, por favor - afirmou, em tom cômico.
A entrevistadora retrucou: - É isso? E ela respondeu:
- É isso. Contudo, ainda no começo da entrevista, a candidata foi questionada sobre políticas públicas e como seria seu primeiro momento na Casa Branca. Kamala apresentou respostas simples, como:
- Há uma série de coisas no primeiro dia - disse.
Relação com Biden
Kamala foi interpelada sobre como foi o momento em que Biden a avisou que estava saindo da corrida.
- Era um domingo. Minha família estava conosco, incluindo minhas sobrinhas, e tínhamos comido panquecas. Estávamos sentadas para um jogo, o telefone tocou e era Joe Biden. Disse o que tinha decidido. E perguntei: "Você tem certeza?". Ele disse: "Sim".
O vice
Governador de Minnesota, Tim Walz passa a imagem, como alguns analistas apontam, do "tiozão" que é técnico de futebol, com características amigáveis. Por diversos momentos enquanto ele falava, Kamala o observava com orgulho, mostrando que há parceria entre os dois. _
Entrevista - Diego Ramos Coelho
Especialista em Relações Internacionais e diplomata de carreira
"Conflitos atuais são fruto de fraturas, mas estão regionalizados"
Especialista em Relações Internacionais e diplomata desde 2010, Diogo Ramos Coelho lança o livro Mundo Fraturado, com uma análise profunda dos desafios que afligem o planeta. Atualmente, é chefe da assessoria de Relações Internacionais do Ministério do Planejamento e Orçamento. Ele conversou com a coluna.
? No livro você fala sobre o aumento dos conflitos, ascensão de líderes autocratas, desinformação e polarização. Há um mal-estar civilizatório?
Sim, esse mal-estar é fruto de uma dinâmica entre o que chamo de forças de coesão, que estruturaram a ordem liberal na qual vivemos, e o que chamo de forças de dissonância. Há essa briga entre o lado que estruturou essa ordem liberal e um outro que forma essas fraturas. Essa briga de forças tem causado essa apreensão e um pouco desse mal-estar.
? É possível comparar a situação com o período pré-Segunda Guerra?
Sim, é possível compararmos com os anos 1920, que também foi momento de crise, de apreensões, de angústias, que, infelizmente, resultaram em uma catástrofe. Mas tenho esperança de que consigamos contornar essas fraturas atuais.
? Há dois grandes conflitos em curso: entre Rússia e Ucrânia e no Oriente Médio, além da possível retomada de Taiwan pela China. Onde você acha ser mais provável o início da Terceira Guerra Mundial?
Ainda não está nesse ponto de ruptura. Podemos olhar para a ordem atual como fraturada, há indícios de que aquela coesão à qual estávamos acostumados na década de 90, no começo de 2000, não exista mais. O mundo hoje é muito mais multipolar. Toda ordem multipolar é um pouco mais instável do que uma ordem na qual só há um grande ator poderoso. A multipolaridade pode ser muito bem-vinda quando você tem mais uma heterogeneidade na divisão do poder, mas à medida que os pontos de poder se multiplicam, isso também pode causar instabilidades. Os conflitos são frutos dessas fraturas, mas ainda estão regionalizados. Eles ainda não adquiriram um caráter sistêmico.
? Vários países emergentes ou economias em ascensão questionam a ordem liberal e o próprio equilíbrio de poder. Já não representa o mundo atual?
Questionam, por exemplo, a configuração do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Já não é um equilíbrio de poder hoje. Alguns países têm um papel e influência marcantes nas relações internacionais. Então, um dos argumentos que trago é que toda ordem nunca é mantida sem a colaboração de outros Estados. A manutenção de uma ordem não depende de uma potência hegemônica. Depende de colaboração entre atores, até para que seja considerada legítima.
? Sobre o tema ambiente, o que observamos são boas intenções e conversas, mas pouca efetividade. Por quê?
É necessário trabalhar dois aspectos: do papel das instituições internacionais ou, mais amplamente, dos regimes internacionais. Fazer com que 190 governos concordem com algo é tarefa muito difícil. Essa dificuldade é inerente ao sistema internacional. Mas é importante observar que, embora não consiga avançar na velocidade e na abrangência necessárias para combater um problema urgente, é possível identificar consensos ao longo do processo. _