segunda-feira, 1 de julho de 2013


01 de julho de 2013 | N° 17478
O CAMPEÃO VOLTOU

Brasil Furioso

Durante os 15 minutos iniciais, a gana brasileira obrigou a Espanha a fazer o que a Espanha nunca faz. A Espanha deu chutão. A fúria brasileira conquistou a Copa das Confederações.

Uma fúria patriótica, arrebatada, fúria de bater no peito, de cantar o Hino Nacional com raiva e lágrimas nos olhos. Foi assim que cantou David Luiz, o jogador-símbolo da vitória, cantou aos urros, de olhos arregalados e queixo erguido.

Foi assim que cantou o Maracanã inteiro, mesmo depois de o sistema de som ter parado de tocar a gravação resumida do Hino, cantou à capela, o Maracanã, como entoasse uma oração. E os jogadores, em campo, se emocionaram, e foram à luta como soldados defendendo as fronteiras de casa, e enfiaram 3 a 0 na Espanha, a reluzente campeã do mundo, a antiga Fúria, que ontem não foi furiosa, foi mansa; a fúria estava do outro lado. A fúria era verde e amarela.

A superioridade brasileira foi total desde o começo. Desde antes do começo. O gol de Fred foi marcado logo no primeiro minuto, mas sua construção começou pelo menos 24 horas antes.

No final da tarde de sábado, a Seleção Brasileira foi ao Maracanã para o chamado “reconhecimento do gramado”. Esse treino é, em geral, meramente protocolar. Os jogadores brincam de bobinho e distendem a musculatura, enquanto o técnico, mãos às costas, se limita a observar.

Nesse sábado, não.

Nesse sábado, Luiz Felipe trabalhou taticamente com os titulares. Ensaiou várias vezes uma jogada que parecia bastante básica: a defesa fazia a bola rodar, até que ela chegava ao pé esquerdo de David Luiz. Que a esticava na diagonal sobre as cabeças dos meio-campistas até Hulk, na ponta direita. A missão de Hulk era cruzar para a área, onde Fred entrava para concluir.

Foi exatamente, precisamente, cirurgicamente isso que ocorreu nos primeiríssimos segundos da decisão. A bola encontrou Fred, que, caído na pequena área, meteu para o gol com o pé direito.

O gol não poderia ser mais emblemático – um gol em que o centroavante marca deitado na grama. Um gol de vontade. De fúria. Eis o detalhe importante desse gol e desse jogo. Essa inversão de papéis. Historicamente, a seleção espanhola, a “Fúria”, sempre foi associada com o ímpeto do touro em uma tourada. Já a Brasileira, a “Seleção Canarinho”, sempre foi o time do futebol-arte, futebol bonito e, não raro, do futebol... Bailarino.

Ontem, não. Ontem, o Brasil foi só coração, e a Espanha foi só frialdade. Durante os 15 minutos iniciais, a gana brasileira obrigou a Espanha a fazer o que a Espanha nunca faz. A Espanha deu chutão. O Brasil marcava em cima, roubava a bola, partia para o ataque com... Fúria. A torcida, nas cadeiras coloridas do Maracanã, não parava um segundo de cantar e gritar. Um jogador da Espanha encostava a chuteira na bola e era vaiado, logo depois o Brasil retomava o controle e todos entoavam:

– Ô, o campeão voltou! O campeão voltou! Estavam certos. Ali estava, de novo, o campeão.

O primeiro ataque tramado da Espanha só foi acontecer aos 19 minutos, quando o craque Iniesta chutou de longe, para Julio César defender. Aos 24, Marcelo roubou a bola e lançou para Fred, que entrou sozinho e bateu para fora. Aos 31, Neymar deu um passe perfeito para Fred e deixou-o sozinho na frente de Casillas, mas o centroavante do Fluminense perdeu o gol. Aos 40, a Espanha finalmente conseguiu encaixar uma troca de passes ao seu estilo. Pedro ingressou livre na área e desviou de Julio Cesar.

A bola ia entrando, quando David Luiz apareceu de algum lugar, atirou-se na bola, as melenas esvoaçando, e a bola saiu por cima da goleira. O Maracanã vibrou como se fosse um gol e gritou em coro:

– David! David! David!

Três minutos depois, Neymar decolou pela esquerda e chutou com... Fúria: 2 a 0.

O clima no estádio deixava claro que a virada espanhola era improvável. Tornou-se impossível logo a um minuto e meio do segundo tempo, quando Fred fez 3 a 0. A torcida estava enlouquecida:

– Ah, o Maraca é nosso! – É campeão! É campeão! – Quer jogar? Quer jogar? O Brasil vai te ensinar! E cantavam o Hino. Cantavam o Hino com sanha ufanista.

Não arrefeceram nem quando Marcelo cometeu pênalti aos oito minutos. Parece que sabiam o que ia acontecer: Sergio Ramos bateu fraco para fora. Aos 22, Piqué fez falta em Neymar e foi expulso. Aí o Brasil passou a tocar a bola. Fez com a Espanha o que a Espanha gosta de fazer com os outros: colocou-a na roda. E a torcida:


– Olé! Olé! Olé! A Espanha levando olé. A Espanha sendo toureada. A Espanha era o touro. Mas não um touro furioso. A fúria, na noite deste 30 de junho no Maracanã, era brasileira.