sexta-feira, 11 de dezembro de 2020


11 DE DEZEMBRO DE 2020
DAVID COIMBRA

Como Quintana veria o jogo do Grêmio contra o Santos

Dizia-se, no Rio Grande, que Mario Quintana não ligava para futebol. Que nem quando tinha Gre-Nal ele se emocionava. Mas, em 4 de maio de 1981, o poeta foi delatado por um amigo, o escritor Josué Guimarães. Em texto publicado na editoria de esportes da Folha de S. Paulo, Josué contou que assistiu à final do Campeonato Brasileiro junto com Quintana, pela TV. E que o poeta sofreu tanto, torcendo pelo Grêmio, a ponto de sentir medo de que o coração lhe fosse explodir no peito pleno de rimas. Mas o Grêmio venceu, com aquele golaço de Baltazar, "o artilheiro de Deus", e Quintana terminou o domingo aliviado e feliz, como têm de ser os finais de domingo dos poetas.

Lembrei de Quintana na partida do Grêmio de quarta-feira, contra o Santos. Pensei que, se ele escrevesse a crônica do jogo, descreveria assim a apresentação do seu time:

"Da vez primeira em que me assassinaram,

Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.

Depois, a cada vez que me mataram,

Foram levando qualquer coisa minha".

Porque, sem Jean Pyerre, o Grêmio perdeu um jeito de sorrir que tinha. Ficou desasado, triste, torto para um lado. Sem elã, como diriam os antigos cronistas.

É verdade que Matheus Henrique jogou uma enormidade, correu, se esfalfou, tornou-se o "Multi-Homem, o rei da multiplicação, que aos bandidos traz a confusão" (você lembra de "Os Impossíveis"?). Mas mesmo todo esse esforço foi pouco. O Santos dominou o meio-campo e, dominando o meio-campo, assenhorou-se do jogo.

O que restou para o Grêmio? Quintana responderia assim:

"Hoje, dos meus cadáveres eu sou

O mais desnudo, o que não tem mais nada.

Arde um toco de vela amarelada,

Como único bem que me ficou".

Essa vela amarelada, o único bem que ficou para o Grêmio, estava no banco de reservas: Ferreirinha.

A entrada do Ferreirinha mudou o jogo. Seu drible pela direita era irresistível. Como um Garrinha, de quem sempre se sabia para onde ia driblar, mas não quando ia driblar, Ferreirinha sempre passou pelos marcadores, sempre foi ao fundo e sempre cruzou. O último desses cruzamentos resultou em pênalti e no gol de empate.

É verdade que havia outra vela amarelada no banco, o pequeno Darlan. Ele deu mais dinâmica ao meio-campo e ajudou a retomar o domínio da partida para o Grêmio.

Darlan, Matheus, Jean Pyerre e Ferreirinha. Mais Pepê, que, na quarta-feira, andava borocoxô, mas, ainda assim, é o Pepê. São os jovens da base do Grêmio. Os guris. Ou, como talvez dissesse Quintana, os passarinhos.

DAVID COIMBRA

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