quinta-feira, 12 de janeiro de 2023


12 DE JANEIRO DE 2023
POLÊMICA EM PORTO ALEGRE

Queda de braço sobre o asfalto

Prefeitura não quer tirar cobertura; Iphan aguarda resposta oficial do município e fala em possível abertura de ação civil pública

Um ano após determinação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) de paralisação das obras de asfaltamento da Avenida Padre Tomé, no Centro Histórico, a prefeitura de Porto Alegre ainda não acatou a decisão da autarquia federal de retirar a cobertura asfáltica de cima dos paralelepípedos no entorno da Igreja Nossa Senhora das Dores, que é tombada. E nem pretende fazer isso.

- Não burlamos legislação, não entramos no bem tombado, foi no entorno. Retirar o asfalto não vai voltar ao status original porque já havia problemas de estrutura - afirma o secretário Municipal de Serviços Urbanos, Marcos Felipi Garcia, confirmando a intenção da prefeitura de não retirar o asfalto do trecho.

Atualmente, a autarquia federal discute o tema com a prefeitura. Em 13 de janeiro de 2022, o prefeito Sebastião Melo chegou afirmar que "se for determinada a retirada do asfalto, vamos retirar".

- Sobre o asfaltamento no entorno da Igreja das Dores, foi encaminhada para análise da prefeitura a minuta de termo de ajustamento de conduta - explica o superintendente do Iphan-RS, Leonardo Maricato.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o termo de ajustamento de conduta (TAC) é um acordo que a instituição celebra com o violador de determinado direito coletivo. Este instrumento tem a finalidade de impedir a continuidade da situação de ilegalidade, reparar o dano ao direito coletivo e evitar a ação judicial.

Impasse

Disponível para consulta pública no site do Iphan por meio do processo 01512.000015/2022-84 (acesse em gzh.rs/iphanpoa), o documento mostra diversas movimentações desde que foi gerado em 11 de janeiro de 2022.

A mais recente, de terça-feira passada, é um ofício encaminhado pelo Iphan ao secretário Municipal de Serviços Urbanos, Marcos Felipi Garcia, em que é concedido à prefeitura mais 30 dias para manifestação sobre a minuta de TAC.

O problema começou há cerca de um ano, quando a prefeitura decidiu cobrir o calçamento original na região da Igreja das Dores sem consultar a autarquia federal vinculada ao Ministério do Turismo. Ao tomar conhecimento da intervenção, o Iphan foi ao local fazer uma vistoria fotográfica e determinou a paralisação das obras no entorno de patrimônio histórico, no dia 13 de janeiro de 2022. Também autuou a gestão municipal. A prefeitura solicitou regularização em 10 de fevereiro, mas teve o pedido negado.

O Iphan alegou que a intervenção não poderia ser considerada "reforma simples" porque se tratava de recobrimento de calçamento original. E a alteração foi reprovada por ter "provocado inequívoca interferência negativa à Igreja das Dores, bem como a todo o conjunto de edificações institucionais de caráter monumental que a ladeiam e criam, tendo a Igreja como protagonista, a ambiência do bem tombado". Desde então, o impasse permanece e o asfalto segue cobrindo a Avenida Padre Tomé.

A portaria 187/2010 do Iphan afirma que vias do perímetro de um bem tombado também devem seguir os padrões de não alteração das características originais, e que qualquer alteração física deve ser previamente consultada junto à autarquia federal.

"Chocante"

A advogada Jacqueline Custódio, integrante do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos) e coordenadora do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro no RS, ressalta que o asfalto não existia quando a Igreja das Dores foi construída.

- Por isso é tão chocante para nós, que trabalhamos com patrimônio histórico, ver aquele asfalto colocado do nada. Não é como uma estrada que recebe muitos carros por minuto. E outra coisa é que a impermeabilidade que o asfalto traz, em termos de sustentabilidade e manutenção, tu perdes isso com esse asfalto - observa Jacqueline.

A especialista ainda cita a questão do entorno:

- Existe uma lei que preserva o entorno. O bem, no caso da igreja tombada, tem que ter um entorno que não atrapalhe a sua volta. A pessoa tem que olhar para o bem e se transportar para o passado.

 ANDRÉ MALINOSKI

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