quarta-feira, 18 de outubro de 2023


18 DE OUTUBRO DE 2023
OPINIÃO DA RBS

FALSA EQUIVALÊNCIA 

Somente um esforço considerável para tentar moldar a realidade de acordo com as próprias convicções, supostamente ideológicas, pode explicar a resolução do PT divulgada na segunda-feira sobre o conflito em curso no Oriente Médio. Um dos principais trechos do documento, aprovado pelo diretório nacional da sigla, simplesmente ignora a natureza e a sequência dos acontecimentos recentes ao equiparar o grupo terrorista Hamas a Israel.

Diz o texto: "Por isso, condenamos os ataques inaceitáveis, assassinatos e sequestro de civis, cometidos tanto pelo Hamas quanto pelo Estado de Israel, que realiza, neste exato momento, um genocídio contra a população de Gaza, por meio de um conjunto de crimes de guerra". É uma equivalência profundamente equivocada e falsa. Os sequestros e massacres covardes de civis desarmados, incluindo crianças, mulheres e idosos israelenses e estrangeiros, foram praticados pelos extremistas baseados na Faixa de Gaza, onde também usam de maneira ignóbil a população palestina inocente como estratégia de proteção de seus membros.

O Hamas é uma facção que tem como um dos objetivos fundadores a eliminação de Israel. Posiciona-se contrário à solução pacífica que inclui a convivência harmoniosa entre os dois povos, com a criação de um Estado palestino. Tem uma natureza violenta, portanto. De outro lado, mesmo imperfeita como todas as demais, Israel tem a única democracia da região, com imprensa livre, oposição política atuante e posições relativas a pautas de costumes consideradas progressistas - alinhadas ao que se reputa como pensamento de esquerda. Não se deve confundir o governo de turno, de viés ultranacionalista, com o Estado ou a sociedade israelense.

Israel tem direito à autodefesa após o maior episódio de assassinato de judeus desde o Holocausto. Mas o revide deve ser entendido e conduzido como uma contraofensiva destinada a neutralizar o Hamas, e não uma guerra contra palestinos. A Organização das Nações Unidas (ONU) e diversos países têm instado Israel a ter mais cautela com a resposta armada para não elevar o número de vítimas sem vínculos com o conflito e a permitir um acordo que viabilize ajuda humanitária. Os avisos do exército israelense para que a população da porção norte de Gaza deixasse suas casas rumo ao sul sinalizam a busca por diminuir o risco de baixas civis.

Sabe-se que o PT é um tradicional apoiador da causa palestina, o que inclui um Estado próprio soberano. A posição é reiterada na nota do partido. Configura-se em uma opinião acertada, inclusive defendida neste espaço como a saída viável para a paz duradoura na região. Também pede a liberação dos reféns pelo Hamas, entre outros pontos. Mas erra ao nivelar um ataque extremista destinado a matar de forma indiscriminada à reação, que, mesmo passível de reparos, visa anular o agressor, o grupo terrorista obstinado pela aniquilação física do agredido.

Com o texto, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva também alimenta o uso do conflito na disputa política interna do Brasil. Assim, incentiva uma discussão pretensamente ideológica rasa, incapaz de levar em consideração as nuances, as raízes do desentendimento histórico e os desvios de ambos os lados que contribuíram para o impasse atual. De forma indireta, o documento da sigla, que diz defender a paz, acaba por incitar manifestações tanto antissemitas como islamofóbicas. Seria melhor se a legenda se alinhasse aos esforços de muitas outras instituições que estão empenhadas na promoção do diálogo.

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