sexta-feira, 20 de outubro de 2023


20 DE OUTUBRO DE 2023
DANIEL SCOLA

Meu encontro com Francisco 

É a quinta vez que venho à Itália. Foram duas viagens a passeio e duas a trabalho. Na última, em 2013, vim pela RBS para descrever ao público gaúcho o conclave que escolheu o papa Francisco como chefe da Igreja Católica. Cheguei ao Vaticano alguns dias antes. Como os cardeais não davam entrevista, resolvi fazer uma apuração com pessoas que conviviam com os participantes do ritual de escolha. Uma delas era o padre gaúcho Antônio Hoffmeister.

Na noite de 13 de março de 2013, sob chuva e frio, os católicos tomaram a Praça São Pedro. Se houvesse consenso, a fumaça branca sairia pela chaminé da Capela Sistina para anunciar que o papa havia sido escolhido. Quando houve a lufada, os católicos vibraram como se o time deles tivesse feito um gol. O novo Papa apareceu na sacada da Basílica de São Pedro: cardeal Jorge Mario Bergoglio. Quando anunciei ao vivo na Rádio Gaúcha o nome do cardeal Bergoglio, saiu a frase que ficou famosa: "É argentino! O novo Papa é ar-gen-ti-no!".

Dez anos depois, voltei a Roma a passeio. Meu cicerone foi o padre Antônio, com quem desenvolvi uma amizade. Ele me levou a uma visita à Cidade do Vaticano num roteiro diferente do turista convencional. Conheci o Banco do Vaticano e o Palácio Apostólico, onde os papas rezam o Angelus, a tradicional missa celebrada aos domingos, ao meio-dia.

No final da visita, o padre Antônio me convida para jantar no Palácio Santa Marta, onde o Papa reside. Enquanto comemos massa com feijão, Francisco entra no restaurante se locomovendo com um andador. Senta-se a uma mesa com religiosos que estavam o acompanhando. Alguns instantes se passaram, até que o padre pede que eu vá ao lado de fora e aguarde a saída do Papa. Nervoso, tiro da mochila um pacote de erva-mate e um folheto com fotos de Porto Alegre, além de fotos da minha família para serem abençoadas. 

Em poucos minutos, ele deixa o restaurante e eu, que nunca tremi para um entrevistado, estou trêmulo e sem fôlego. Só o cumprimento e entrego os presentes. Antes de pedir a bênção, o padre Antônio conta ao Papa a minha história: o jornalista que teve câncer e está vivo. O Papa diz duas frases que nunca mais sairão da minha cabeça: "Deus te abençoe. Esse come polenta".

Ele tem razão, eu adoro polenta. A cena nunca vai me abandonar.

DANIEL SCOLA

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