O trem do Peru e o filho de Levy
Joaquim Levy não foi assistir ao parto do seu filhote querido, o plano de controle de gastos do governo, o ajuste fiscal. Disseram que o ministro da Fazenda estava gripado. Pode ser. Pode ser também que Levy tenha achado que o filho não fosse bem dele. Gente do Planalto fazia esse tipo de fofoca escarninha, no final da sexta-feira.
Essa foi a primeira e a menos importante das esquisitices da divulgação do Orçamento federal de verdade, o plano de gastos e arrecadação que deve valer até o final do ano. Segunda esquisitice: os gastos de 2015 não serão equivalentes aos de 2013 nem nas promessas de papel orçamentário, como Levy dizia desde fevereiro.
Terceira: o governo espera que a arrecadação de impostos cresça uns 5% neste ano, em termos reais. Mas a receita real até abril caiu quase 3%. Puxado.
Quarta: o governo fez essa estimativa otimista mesmo enquanto o Congresso ainda talha e diminui o pacote fiscal.
Quinta, tendo se arriscado a essas pequenas temeridades, não enfatizou que talvez seja necessário aumentar ainda os impostos.
De mais previsível, o governo indicou que vai cortar mesmo uns 30% da despesa de investimento (em relação a 2014, pelo menos no que diz respeito ao PAC. Imagine-se no resto). Tende a ser mais.
Enfim, em relação a 2014, a promessa é baixar a despesa em 1%, se der tudo certo (em termos reais). Parece pouco, muito menos do que a promessa inicial de cortar 6%. No entanto, mesmo essa redução de 1% é rara. Nos três anos em que foi responsável pelo Orçamento, o governo Dilma 1 elevou o gasto em mais de 6% ao ano, em média.
TREM DO PERU
A presidente Dilma Rousseff tem uma queda esquisita por trens. Não por um "trem bão", como dizem alguns de seus conterrâneos. Mas pelo "trem da alegria" de quem gosta de torrar dinheiro em "viagens".
Antes, viajara na ideia doidivanas do trem-bala, aquele que estaria pronto para ligar São Paulo e Rio já na Copa de 2014. O negócio era um disparate tão grande que, nem com dinheiro quase dado, essas empreiteiras Lava Jato quiseram embarcar.
Agora, a presidente veio com a história do trem do Peru, que ligaria o centro do Brasil ao Pacífico passando em parte pela Amazônia e pelos Andes, "corredor da exportação agropecuário" por onde nem os agropecuaristas querem correr.
O Brasil não consegue terminar a obra de quase 30 anos da Ferrovia Norte-Sul. Não consegue nem começar direito as obras essenciais de ferrovias que ligariam a Norte-Sul a Goiás e ao litoral da Bahia.
O governo não consegue ligar à rede elétrica usinas de eletricidade prontas a fios. Não consegue colocar trilhos nem no sertão desértico da Bahia, por incompetência básica, rolos ambientais e outras burocracias. Mas quer fazer o trem da floresta do Peru. Um negócio da China.
De onde teria vindo essa mania de trens? De uma infância feliz passeando em marias-fumaça mineiras? Da vontade de imitar mais um desastre econômico da ditadura, como a Ferrovia do Aço? Da ideia desenvolvimentista vulgar de que os EUA cresceram porque fizeram ferrovias "coast to coast" no século 19, do Atlântico ao Pacífico?