19
de maio de 2015 | N° 18167
CARPINEJAR
Perdi a guerra
Ok,
perdi. As pessoas me acham louco. Não tenho como destruir a reputação. Peguei
picareta e reformei a casa do nome e não me desgrudo da fama de doido. Não é entrando
no Lions Clube que mudarei minha aparência.
Qualquer
fofoca fará sentido porque o louco não tem sentido algum. Não alcanço o que os
outros pensam a meu respeito, prevejo o tamanho do poço de maldade em que estou
enredado. Se alguém falar que desço do meu apartamento pela janela do terceiro
andar segurando uma corda, todo mundo acreditará e verá nexo na cena matinal. “Bem
coisa dele” será o comentário. Não vão estranhar. Nenhuma extravagância acaba
sendo posta em dúvida. O desequilíbrio é o esperado, a normalidade que soa
estranha em meu caso.
Por
algum motivo, sou louco, e louco inteligente a ponto de não ser confinado para
não aloprar os médicos. Antes pensavam que eu chamava atenção, depois
descobriram que não era um talento oportunista, o feio chama a atenção
naturalmente, pena que não passaram para a terceira fase do jogo da vida: não
sou maluco, sou apenas atrapalhado e me envolvo em encrenca procurando a porta
de saída.
A
loucura não me ajuda em nada a ser feliz. Pelo contrário, cria preconceitos,
gera medo, cautela e defesa de quem é mais reservado. Quando participo de
conversas, existe o receio de que tome alguma atitude intempestiva, imprevisível,
que dance maracatu a capela. E eu estou na minha, apenas ouvindo, não
maquinando ataques terroristas de linguagem e ironia.
Agora
foi. Preciso me acostumar, não tem conserto. Apenas os amigos mais próximos – poucos
– me conhecem.
Perda
de tempo defender que não bebo e não me drogo, não saio dirigindo alterado, que
amo cinema, leitura e café, que me inclino a caretice e timidez, que reúno
coragem para atravessar um shopping lotado, que acordo cedo para trabalhar, que
cumpro horários, que cuido da limpeza da casa inteira, que realizo
supermercado, troco os lençóis semanalmente, lavo roupa, que cozinho, que me
preocupo em repor as flores da sala, que não deixo nenhuma conta atrasar um
dia, que me responsabilizo por dois filhos, que valorizo a disciplina como
humildade e que agradeço a Deus o trabalho para sustentar a família.
Mas
sou louco. Porque ainda comentarão que nenhum louco se assume.