27
de maio de 2015 | N° 18175
MOISÉS MENDES
A missão de Levy
Nada
é mais excitante para quem torce contra o governo do que imaginar a saída do
ministro da Fazenda. Para Joaquim Levy, a questão pode ser outra: nada pode ser
mais ameaçador do que se imaginar de volta ao banco, para cuidar de rotinas
tediosas com assessores entediantes. Ou alguém imagina que Levy pode ter alguma
vantagem trocando a aventura no governo pela pachorra de um banco em que a
decisão mais aguda a tomar envolve a calibragem do juro?
Bancos
têm de decidir hoje se o juro do cartão será de 290,3% ou de 289,5% ao ano. Há
quem diga, e não são poucos, que esse é um juro de exceção. Que a taxa de
atraso no pagamento do cartão é a punição para os que não sabem controlar seus
gastos. Sabemos muito bem quem são os punidos com esse juro.
O
juro-aberração do cartão pune o povo desinformado sobre as armadilhas
financeiras e o assalariado que se perdeu nas contas ou perdeu o emprego. Não
há espertos entre devedores dos cartões. O devedor do cartão é o enforcado que
pode inviabilizar sonhos e projetos por anos, porque o banco decidiu que ele
deve pagar o juro mais alto já praticado em toda a história da humanidade.
Nenhum
agiota, desses que quebram dedos de devedores, se sentiria moralmente
autorizado a multiplicar por quatro, em apenas um ano, a dívida de quem comprou
uma geladeira e não consegue pagá-la. Mas, no Brasil, tudo é normal.
A
taxa do cartão ficou agora próxima do patamar de março de 1999, quando o juro básico
(a tal Selic) era de 44,95% ao ano. A Selic é hoje de 13,25%. Saberemos um dia,
quem sabe, por que lidamos com naturalidade com o absurdo do juro no Brasil,
como se a mais brutal transferência de renda para o setor financeiro estivesse
no contexto do que é assustador e ao mesmo tempo razoável.
Joaquim
Levy não cuidava de juros no Bradesco, nem cuida disso no governo, porque essa
é uma tarefa do Banco Central. Era chefe da gestão de ativos, a área que trata
da engenharia financeira. Imagine o mais poderoso ministro de Dilma, incumbido
até de tarefas políticas pelo Planalto, de volta à sua sala no banco, onde a
rotina será de despachos limitados ao campo de visão de seus subordinados.
A
ampla missão de ajudar a salvar o Brasil – um país que pode acabar a qualquer
momento, segundo alguns videntes – seria reduzida à tarefa de assegurar
rentabilidade ao patrimônio do banco que o emprega. Seria pouco para Levy. Mas
esse é o grande sonho da oposição.