13
de maio de 2015 | N° 18161
OLHARGLOBAL
| Luiz Antônio Araujo
Dois livros
“Basta
a Terra completar mais uma circunvolução, e comemoramos”, diz a professora
Walnice Nogueira, ironizando a obsessão atual com efemérides. Em meio a um
festival de aniversários, jubileus e celebrações de tudo e de todos, a validade
desse hábito depende da qualidade da reflexão que se engendra. Os 70 anos do fim
da II Guerra Mundial não fogem à regra. Mas, pelo menos desde que Cláudia
Laitano escreveu sobre o assunto em Zero Hora (zhora.co/claudialaitano), a
ocasião está mais do que justificada.
Cláudia
diz que o primeiro livro que lembra de ter pedido de presente foi O Diário de
Anne Frank – provavelmente um dos cinco best-sellers mundiais sobre a II
Guerra. Em seguida, afirma que foi a leitura de É Isto um Homem? e A Trégua, de
Primo Levi, que lhe permitiu começar a entender o Holocausto. A II Guerra, diz Cláudia,
é o “fato histórico incontornável” da cultura nos últimos 70 anos. E como não
seria?
É
notável que O Diário e É Isto um Homem?, dois dos livros citados por Cláudia,
tenham sido publicados no mesmo ano, 1947. Apesar de serem ambos memórias de
guerra aparecidas quase no calor da hora, a recepção a cada um não poderia ser
mais distinta. Anne morreu aos 15 anos em Bergen-Belsen, mas seu relato ganhou
corações e mentes e deu origem a uma infinidade de outras obras, museus e
filmes.
Levi
sobreviveu a Auschwitz-Buna e foi testemunha participante do pós-guerra. Mais
de um editor italiano rejeitou sua obra, e a primeira versão em inglês só
apareceu em 1959. O mais perto que o cinema chegou de É Isto um Homem foi a
filmagem de uma peça adaptada da obra.
Se dois
livros tão aparentados produziram efeitos tão diferentes, a explicação –
arrisco – está na forma como a memória da II Guerra se modificou. E no que
consistiu essa mudança? Volto ao assunto na próxima coluna.