17
de abril de 2015 | N° 18135
MOISÉS
MENDES
Crianças voam
Quando
completou três anos, em dezembro de 2013, meu neto Joaquim decidiu que já
poderia ganhar uma prancha de surfe de adulto. Um dia, paramos na frente de uma
loja no Campeche, no sul da ilha de Florianópolis, e ele achou que era a hora.
Eu disse:
–
Quando fores grande, vais ganhar a prancha de gente grande.
–
Mas eu já sou grande – respondeu ele.
E
fez um gesto que repetiria muitas vezes, com as duas mãos subindo desde os
joelhos até o peito estufado. E disse, com a cabeça erguida, como se tivesse
sido espichado por aquele movimento:
–
Olha, eu já sou grande.
Eu e
a avó Virgínia tentamos convencê-lo de que ainda não era. Conseguimos. Mas há
três meses Joaquim fez quatro anos e anunciou outra decisão:
– Eu
quero ser adulto.
A
palavra adulto se repetia. Ele não queria mais ser grande, mas adulto, para,
claro, poder surfar. Até que Joaquim ganhou uma roupa de Batman, com capa e
tudo. Eu me encarreguei de alertá-lo de que aquela roupa não o habilitava a
voar.
Ele
me olhou como se não tivesse ouvido nenhuma novidade. Reforcei então a
advertência. Algumas coisas só os adultos (a palavra mágica) podem fazer:
– O
Batman voa, mas é adulto. E tu é uma criança.
Ele
respondeu mexendo na capa, displicente:
– O
Batman não voa porque é adulto. É porque ele é super-herói.
Me
senti o babaca da racionalidade. Até que numa tarde de fevereiro, no posto de
gasolina do Campeche, enquanto eu abastecia o carro, Joaquim, esparramado na
cadeirinha, anunciou para os avós:
– Eu
não quero mais ser adulto.
Por
quê? Porque não e pronto. Sem debates. Conto essa história depois de ler as
reportagens sobre a menina consultora Kylee Majkowski. A americana de 10 anos
que corre o mundo dando palestras esteve nesta semana em Porto Alegre.
Kylee
criou a Tomorrow’s Lemonade Stand (Banca de Limonada do Amanhã), para ensinar
empreendedorismo a crianças a partir de sete anos.
A
mãe dela, Amanda, é a incentivadora. Amanda diz que as crianças “precisam
conseguir dinheiro, precisam vender, precisam fazer de verdade”. Então, que
assim seja, para que tudo pareça de verdade, desde os sete anos.
Produzir,
vender, monetizar, rentabilizar. Aos sete anos. É o mundo do empreendedorismo.
Amanhã,
falarei com Joaquim pelo Skype. Espero que ele continue querendo surfar.