27
de abril de 2015 | N° 18145
MARCELO
CARNEIRO DA CUNHA
A MORTE DE UM
PUBLICITÁRIO
Mad
Men é claramente psicografada por um blend de Tennessee Williams com Arthur
Miller, teatro americano da mais alta qualidade, herdeira de Um Bonde Chamado
Desejo e Morte do Caixeiro Viajante, com Don Draper no papel de todos os
personagens trágicos que já passaram pelos palcos brodueianos.
Na
última metade de sua última temporada, Mad Men se transforma ainda mais em uma
pintura de Edward Hopper, e se alguém ainda não percebeu, olhe para Nighthawks.
Draper é a condensação da solidão americana, a solidão cercada da possibilidade
de riqueza por todos os lados, e nem assim menos abandonada.
Mad
Men é tão bom que os seus personagens mais desprezíveis são maravilhosamente
desprezíveis. Harry é o símbolo desse mundo de seres que se deslocam por uma
escada rolante sobre um mundo que não compreendem, e apenas vendem.
Na
Broadway, a última montagem da Morte do Caixeiro foi com o brilhante Philip
Seymour Hoffman, que, sabemos, morreu. A entrada dele em cena ao som de Boy, Oh
Boy é antológica. Em Mad Men, o homem vencido pelo peso de carregar o sonho
americano é substituído pelo homem que não compreende por que alguém compraria
o sonho que ele sabe muito bem do que é feito, por ser ele quem o faz. Don
Draper não tem ilusões, porque ele as constrói, embala, vende, em troca de
milhões de dólares e uma solidão inafiançável.
Mad
Men já deixou claro que não existe qualquer chance de Don virar um sujeito
bacana e bonzinho, para a felicidade geral da nação. Em um mundo definido pela
frieza, ele é apenas um profeta, mesmo que nada interessado em propagar sua
mensagem. Ele vende produtos, mais nada.
Arte
é arte. Fotografia de anúncios é apenas comércio, nos diz Stan, que adoraria
ser artista e agora sabe que o que é, graças a uma fotógrafa talentosa e
bissexual, mais talentosa do que bi, aparentemente. Mad Men é arte sobre o que
não é arte, e é vida sobre o que não tem vida alguma. Por isso, quando Mad Men
acabar, daqui a pouco, um palco vai ficar vazio e triste, sem nada que nos
compense a perda. Mad Men sai de cena espalhando tristeza, exatamente como faz
o grande teatro. Aqui em casa, rola uma lágrima antecipada, e imagino que do
lado daí dessa página, também.
Snif
a todos, e até a próxima.