21
de abril de 2015 | N° 18139
LUÍS
AUGUSTO FISCHER
UM IRMÃO ALEMÃO
Não
imagino como pode ser a sensação de ter um irmão de sangue e não conhecê-lo ao
vivo. Como se mede isso – seria como uma angústia? Como uma esperança? Ou seria
como, nas palavras de Guimarães Rosa, a sensação de um oco sem beira?
Um
contemporâneo conterrâneo nosso, conhecido por todo mundo, o inventor de
personagens e mundos Chico Buarque de Holanda, passou por essa. Na vida real.
De fato, seu pai, quando jovem, viveu na Alemanha, antes da ascensão de Hitler.
E lá, numa aventura amorosa, acabou tendo um filho.
Circunstâncias
o fizeram retornar ao Brasil, sem o filho, nem sua mãe. Aqui veio a casar, com
outra mulher, e a ter filhos, entre os quais Chico. E seu filho alemão por lá
permaneceu. Só que “lá” não era qualquer lá: era a Alemanha da guerra, do
nazismo. E o filho de Sérgio, como estaria?
O
filho Chico, aqui, antes de seus 20 anos estava mostrando seu enorme talento,
em canções marcantes e eternas, que não param de brotar – se o senhor não ouviu
o mais recente CD, deveria parar tudo imediatamente e ir lá atender esse
imperativo estético, ouvir a valsa Nina, por exemplo. Chico, agora com mais de
70 anos – difícil imaginar, né? –, resolveu escrever um romance, uma ficção,
que tenta encontrar a borda desse oco.
O
Irmão Alemão é uma ficção, um romance como os outros do Chico, que desagradam
aos que, fãs de sua canção de narrativa sempre transparente, não aceitam que no
relato longo ele se permita ser obscuro, sugestivo, indiciário, sempre profundo
(daria para dizer psicanaliticamente profundo).
Mas
é um belo livro, uma ficção com esse background real, factual, processado de
modo tangente à realidade: o narrador, filho de intelectual requintado, tem um
irmão alemão, que descobriu ao acaso de umas cartas antigas desde muito
escondidas, e passa a viver sua vida em função de ir ao encontro dele. Uma
linguagem sempre exemplar, em mais uma história opaca de boa força sugestiva.