sábado, 2 de maio de 2015


02 de maio de 2015 | N° 18150
CLÁUDIA LAITANO

Emanuel e os professores

No mesmo dia em que os grandes jornais do país, Zero Hora inclusive, estamparam na capa as imagens do violento confronto da quarta-feira entre professores e policiais militares em frente à Assembleia Legislativa do Paraná, a foto que ocupava quase toda a primeira página do jornal Diário Gaúcho era a de um menino encontrado morto, na noite de terça-feira, na Restinga.

Emanuel tinha 12 anos, mas aparentava bem menos. Quando foi encontrado, vestia bermuda de surfe, camiseta Nike, chinelos de dedo e cinco balas espalhadas pelo corpo franzino. Nos últimos três anos, contam os repórteres Eduardo Torres e Renato Dorneles, Emanuel fugiu pelo menos nove vezes de casas e abrigos para menores. Era figura conhecida dos assistentes sociais da região central de Porto Alegre – que haviam tentado, mais de uma vez, convencê-lo a sair da rua e voltar para casa. A mãe, catadora de lixo, também não conseguia mantê-lo por perto.

Apreendido no mês de fevereiro por tráfico, Emanuel foi colocado em um abrigo em São Leopoldo, de onde, pela última vez, acabou escapando também. A polícia suspeita que ele tenha sido aliciado para vender drogas em Porto Alegre, na Restinga, onde esta breve e previsível história terminou como todos imaginavam que terminaria. (Com exceção, talvez, do epílogo: a foto em destaque na capa de um jornal e o título desta coluna.)

Para algumas pessoas, a trajetória de Emanuel talvez sugira que a maioridade penal deveria ser reduzida para os nove anos, idade em que muitos meninos como ele começam a ser atraídos pelo tráfico. Ou mesmo antes, quem sabe (em fevereiro, foi apreendido, no Rio, um pequeno assaltante de seis anos, apontado pelo comparsa de nove como o verdadeiro “cérebro” criminoso da dupla). Talvez, por segurança, as leis devessem imitar Herodes e bater em todas as portas, de todas as casas (pobres), condenando à morte todos os meninos. O céu, ou o inferno, é o limite.


Na contramão do autoengano de que mais e maiores presídios poderiam resolver os problemas sociais do país, é possível ver no episódio que colocou professores na mira de balas de borracha e na morte do menino que morava na rua não uma coincidência aleatória do noticiário, mas a confirmação de uma correspondência tão evidente que chega a ser redundante: sem a valorização dos professores, não existe educação pública de qualidade, sem educação pública de qualidade há poucas chances de que meninos como Emanuel consigam mudar o curso da própria história.