quinta-feira, 2 de abril de 2015


02 de abril de 2015 | N° 18120
DAVID COIMBRA

O PT e o amor

Mas esses caras gostam do PT! Gostam mais do PT do que do Brasil.

Eu não desgosto do PT, como pensam alguns. Mas, gostar, não gosto. Já gostei mais, embora nunca, em tempo algum, chegasse perto dessa paixão fremente que tantos demonstram, o que, de certa maneira, é mérito do PT.

Sei bem que o amor vem se esvaindo a cada desilusão, e as desilusões têm sido oceânicas. Ainda assim, os devotos do PT que restam demonstram uma paixão febril e, por isso, como todos os apaixonados, tornam-se medonhamente chatos.

Muitos desses apaixonados se reuniram na segunda passada para avaliar por que as pessoas estão gostando menos do PT. Era uma reunião dos presidentes dos diretórios do partido. Bem. O que acontece quando alguém que ama tenta analisar o desamor do ser amado?

O erro.

Quem ama sempre se equivoca ao tentar descobrir as causas do fracasso do amor. Tipo o Rei Roberto fazendo autocrítica: “O meu erro foi amar demais”.

Seguindo esse caminho, os petistas chegaram à conclusão de que as pessoas que passaram a odiar ou simplesmente desgostar do partido desenvolveram esses sentimentos devido aos acertos das administrações Lula e Dilma. “Perseguem-nos pelas nossas virtudes”, escreveram num documento ao fim do encontro, num tom que não deixa de ser comovente.

É o raciocínio de todos os devotos. Dos cegos de paixão.

Mas quem não está apaixonado pode responder:

Por que o desamor? Por que o ódio da classe média ao PT?

A corrupção incomoda a classe média, sim, mas não é essa a principal causa da falta de afeto. Há cerca de dois anos, nas famosas manifestações de junho, a classe média já explodiu nas ruas, e o grosso da corrupção ainda não havia sido posto a descoberto. A corrupção é grave, foi uma traição, mas, se tudo vai bem, uma traição não é suficiente para terminar a relação.

A ascensão dos que ganham Bolsa Família também não incomoda a classe média, acredite. A maioria das pessoas aprova o Bolsa Família e reconhece nela o maior predicado do governo.

A classe média nunca esteve realmente feliz no Brasil. Nos primeiros mandatos de Lula e Fernando Henrique, esteve esperançosa; feliz, nunca.

Eis o busílis: a infelicidade é a causa do desamor. E a causa da infelicidade é a ineficiência do governo, as dificuldades da vida. As coisas não funcionam no Brasil. Simples assim.

O governo tenta convencer a classe média de que esse desconforto é a paga pelo suposto aumento de conforto das classes mais baixas e que reclamar do desconforto é egoísmo. Por um momento, a classe média aceitou pagar esse preço, mas, agora, 12 anos depois, se pergunta: quanto tempo ainda mais? A paciência se foi. O amor acabou.

Os devotos argumentam que ainda existe sentimento, porque a eleição foi vencida. Outra ilusão. A eleição foi vencida porque a alternativa era ruim. O PSDB é um partido mixuruca. Péssimo pretendente. As pessoas olharam para o PSDB e suspiraram: “Acho que vou ficar com esse mesmo que está aí. Pelo menos esse eu conheço...”.


O governo do PT e os brasileiros romperam, mas vão ter de continuar convivendo por mais três anos e meio. Seria bom que, de alguma forma, se acertassem. O mais saudável para todos é que o gostar do Brasil seja maior do que o desgostar do PT.