RUTH
DE AQUINO
02/04/2015
23h21 - Atualizado em 03/04/2015 12h22
Menores de 18 anos não sabem o que
fazem?
Sou
a favor da redução da maioridade penal. Não considero adolescentes os jovens de
16 a 18 anos
E
por não saberem o que fazem, não podem ser presos, mesmo quando matam a tiros
por motivo torpe, por um celular, um par de tênis, uma bicicleta, uma bolsa ou
um carro. Eles sabem manejar uma arma, sabem dirigir, podem votar, transam,
fazem filhos, não se sentem mais na obrigação de obedecer aos pais. Mas não
sabem que tirar uma vida deixa crianças órfãs e pais destruídos. Você acredita
nisso?
Pela
lei brasileira, eles são inimputáveis. Mesmo após um crime hediondo, os menores
não podem ser responsabilizados pela Justiça. Sua ficha policial continua em
branco. Alguns irão para um reformatório e logo serão soltos. Podem aterrorizar
famílias nas praias, ônibus, metrôs, podem estuprar, matar a namorada por
ciúme. E continuam com ficha limpa. Por isso assumem a culpa por crimes
cometidos por maiores. Os menores são os cúmplices ideais. São os “laranjas”
dos chefões.
Pela
primeira vez, o debate sobre a redução da maioridade penal se torna legítimo no
Congresso. O ministro do STF Marco Aurélio Mello acha que o limite mínimo de 18
anos para a responsabilidade criminal não é cláusula pétrea da Constituição. A
idade pode ser reduzida pelo Congresso por emenda. Essa é uma boa notícia
porque o debate passa a ser às claras.
Questões
comportamentais – como a adoção de crianças por homossexuais, a
descriminalização da maconha, o ensino da religião nas escolas, o desarmamento,
o direito ao aborto – se beneficiam da discussão no Congresso e na sociedade.
Os hábitos mudam. Com o debate e exemplos de fora, é possível até mudar uma
convicção. Na Grã-Bretanha, a maioridade penal é de 10 anos, na Alemanha é 14.
Menores assassinos não são “apreendidos”, e sim julgados.
Sou
a favor da redução da maioridade penal para 16 anos. Por uma razão de senso
comum, nada a ver com ideologia ou “vingança”: não enxergo os de 16 a 18 anos como adolescentes. Não vem
ao caso se são pobres ou ricos, se foram à escola ou não, eles são jovens
adultos e devem pagar por seus atos como os maiores. Se os pais são criticados
quando os infantilizam, a lei também não deveria. Passar a mão na cabeça,
tratá-los como incapazes de discernir o certo do errado nem faz jus às
“competências” da rapaziada de 16 anos. Eles detestam ser tratados como
criancinhas. Quando convém.
Mas
discordo da “bancada da bala” e da “bancada evangélica”. O principal argumento
deles é: com a redução para 16 anos, cairá a criminalidade. Não dá para
acreditar nisso. Estima-se que 1% dos homicídios são cometidos por menores no
Brasil. Sei lá se é verdade, porque nossas estatísticas são muito falhas. Mas
os 53 mil assassinatos anuais não mudarão quase nada por causa dessa lei.
Os
deputados pró-redução afirmam que os traficantes de drogas deixarão de aliciar
os menores de 18 anos. Há resposta pronta para isso: os bandidos passarão a
mirar nos de 15 anos, e não de 16. É verdade. Mudará algo no fim? Talvez. Os
que já têm 16 anos, sem perspectivas e fora da alçada da família, são as
maiores vítimas. A vida não tem valor para eles. Não é assim em países mais
pobres – e mais rigorosos – que o nosso.
Quem
prefere deixar a lei intacta diz que “a direita” quer encarcerar todos os
menores que, sem ensino fundamental, saem matando. E que as prisões brasileiras
não melhoram ninguém, são depósitos de indignidade e escolas do crime. Certo.
Nossos presídios são medievais e a superlotação é a mais branda das violações
de direitos humanos. Mas por que nenhum deputado grita a favor dos jovens de 18
anos? No dia em que faz 18, ele pode então entrar no inferno? Já é “de maior”,
deixa de ser “jovem”?
Os
presídios deveriam se transformar em centros de ressocialização para qualquer
idade. Deveriam mostrar que o crime não compensa e que o conhecimento e o
trabalho enobrecem. Os reformatórios juvenis brasileiros talvez sejam, em
muitos aspectos, piores que as prisões.
Dizer,
como o advogado Marcos Fuchs, de 51 anos, da ONG Conectas, que a redução da
maioridade penal colocaria adolescentes num ambiente prisional controlado por
criminosos é ignorar nossa realidade. Eles já nascem e crescem em ambientes
controlados por criminosos. Fuchs afirmou que, com essa lei, o Brasil iria
contra a resolução da ONU que protege os adolescentes. Em que lugar – dentro ou
fora de cadeia – o Brasil protege os adolescentes? Ou os bebês, as crianças e
suas mães? Trabalho escravo, prostituição infantil, a lista é extensa e
vergonhosa.
Só a
educação universal e de qualidade pode transformar a vida dos brasileiros de
todas as idades. Só assim reduziremos a apavorante criminalidade. Junto com
saneamento, postos de saúde, crédito para microempreendedores, ginásios
esportivos.
Essa
lei mudaria tudo? Claro que não. Manter a maioridade penal de 18 anos
protegeria os menores carentes? Claro que não. Talvez fiquem mais protegidos em
“presídios educativos” do que abandonados pelos pais, pelos deputados e pelo
Estado nas ruas. Nossa pátria não é mãe gentil.