terça-feira, 25 de junho de 2013


25 de junho de 2013 | N° 17472
CLÁUDIO MORENO

É assim que deve ser

Como dizia Montaigne, ninguém sai de mãos abanando quando lê alguma página de Sêneca, o pensador romano que melhor escreveu sobre a natureza humana. Como um diamante de um tesouro muito antigo, o que ele disse há dois mil anos sobre nossa existência nunca vai perder seu valor, como se vê no trecho abaixo, que parece ter sido escrito para todos nós, os brasileiros de hoje – tanto para os mais jovens, que saem às ruas com o entusiasmo de quem tudo quer mudar, quanto para os mais velhos, que lamentam que este mundo não mais tenha remédio.

Sêneca, que conheceu muito bem os tempos de crise (foi homem influente na corte do imperador Nero!), descreve uma sensação que todos nós conhecemos: “Nossos antepassados assim se queixavam, assim nós também nos queixamos, e assim vão se queixar nossos netos e bisnetos: todo mundo é corrupto, a maldade sempre vence e nossa sociedade despenca velozmente pela ladeira que conduz à decadência!

No entanto, não há nada de novo acontecendo: tudo está como sempre foi, e assim vai continuar. O que muda é a direção – ora um pouco mais para lá, ora um pouco mais para cá, como as ondas do mar, que sobem mais ou menos na areia da praia, dependendo da maré”.

Como se vê, tudo está em seu lugar. Que a voz da experiência tenha um tom mais pessimista, nada mais natural – o que não impede, porém, que uma das grandes glórias da juventude seja exatamente ignorar as previsões dos mais velhos para lançar-se nas asas da esperança e da imaginação. Não faz mal que, para uns, a Idade de Ouro tenha ficado lá atrás, enquanto outros jurem que ela nos espera lá adiante, no futuro. Todos estão cumprindo o seu papel, e é necessário que assim seja.

Quanto ao futuro, aliás, sempre é bom lembrar o que nos conta Beda, o Venerável, em sua História Eclesiástica do Povo Inglês: no séc. 7, no início da Idade Média, um dos conselheiros do rei Edwin, da Nortúmbria, criou uma famosa metáfora para descrever a condição humana:

“Nossa vida se assemelha ao curto voo de um pardalzinho que atravesse a sala de banquetes, aquecida por um bom fogo, onde Vossa Majestade e seus conselheiros estejam reunidos para jantar, numa fria noite de inverno.


A avezinha entra por uma porta e sai por outra; enquanto voa pela sala, está livre da gélida tormenta e pode aproveitar a luz e o calor da chama da lareira – mas logo estará lá fora, outra vez, mergulhando de novo no frio e na escuridão. Assim é a nossa vida, meu rei: nós a temos por pouco tempo, e nada sabemos do que veio antes e do que virá depois”.