sábado, 12 de maio de 2018


12 DE MAIO DE 2018
CLÁUDIA LAITANO

GUARDIÃ DAS PRÉ-HISTÓRIAS



De tempos em tempos, meu aniversário coincide com o Dia das Mães - como neste 13 de maio. Sempre gostei dessa vizinhança no calendário, mas a data ganhou novos significados, como não poderia deixar de ser, depois que passei a ser duplamente homenageada em domingos como este.

Gosto de pensar que as duas comemorações são, de certa forma, complementares. Se nenhuma outra pessoa no mundo dá tanta importância ao seu aniversário quanto sua mãe, festejar a data é lembrar que a estrela principal daquele dia não era você - ou apenas você. Todos os aniversários são uma espécie de filial do Dia das Mães no resto do ano. O meu, neste domingo, é matriz e filial.

O aniversário marca a passagem do tempo, a mudança de idade, o amadurecimento, mas é também uma piscadela para a nossa infância. Seja reunindo os amigos mais próximos em uma mesa de bar, seja festejando em grande estilo com dezenas de convidados, estamos sempre tentando reviver aquela sensação infantil de que este dia é realmente especial, e o mundo (ou pelo menos o nosso mundinho) parou para celebrar nossa existência. ("No tempo em que festejavam o dia dos meus anos / Eu era feliz e ninguém estava morto. / Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos / E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer", resume o poema de Fernando Pessoa.)

No aniversário, ninguém se constrange em soprar velinhas, cantar, bater palmas - mesmo que o aniversariante esteja rodeado de netos. Pelo contrário. Quanto mais velho a gente fica, mais parecidos com festas infantis ficam os nossos aniversários. Como se esse dia do ano servisse exatamente para convidar de volta à mesa a criança que um dia fomos. Enquanto isso, o adulto dentro de nós fecha para balanço por 24 horas: tudo bem até aqui? O que poderia estar melhor no ano que vem? Um ano a mais, descontadas as ansiedades de cada etapa da vida, pode parecer apenas mais do mesmo. Ou ser tempo mais do que suficiente para que tudo vire de cabeça para baixo - o que pode ser um alívio ou um tormento.

Se no dia do meu aniversário ainda posso brincar de ser criança, no Dia das Mães sou irremediavelmente adulta. Durante boa parte da minha vida, esse dia teve um rosto, um cheiro, um calor. A palavra "mãe", dita de forma banal ou como um pedido de ajuda ou carinho, instaurava um campo de afeto que me envolvia e situava no tempo e no espaço - e no centro do universo (pelo menos na minha fantasia). Enquanto viveu, minha mãe foi o repouso e o conforto da parte de mim que nunca vai crescer.

Quando minha filha nasceu, a palavra "mãe" começou a apontar para fora e para frente. O vetor do tempo se inverteu. Agora sou eu a guardiã das pré-histórias de outra pessoa, e a palavra "mãe", dita por ela, vem acompanhada de expectativas, sonhos, aflições, perguntas. Enquanto uma parte de mim nunca esqueceu como é ser filha, a outra está sempre aprendendo a ser mãe.

CLÁUDIA LAITANO