terça-feira, 24 de setembro de 2013


24 de setembro de 2013 | N° 17563
LUÍS AUGUSTO FISCHER

A feira e a imaginação

Fico meio desconfortável em situações de suspense, especialmente quando meu futuro está em jogo. Por temperamento, formação e limitações, prefiro agir como diz aquela velha canção (Milton Nascimento e Fernando Brandt): “Já não sonho, hoje faço com meu braço o meu viver”. Trabalho para tentar alcançar o que pretendo, e prefiro não depender do incerto.

Quinta-feira passada enfrentei mais uma situação de suspense, ao figurar como um dos 10 escritores indicados para a honrosa posição de patrono da Feira do Livro de Porto Alegre. Já tinha passado por ela outras vezes, portanto já tinha sido um dos não escolhidos; agora foi meu nome o proferido pelo patrono do ano passado, Luiz Coronel.

Claro que fiquei feliz; mas não me sinto confortável sabendo que outros nove companheiros precisaram adiar o justo sonho de verem seu nome enunciado. Sou ruim de competição, no fim das contas; me orgulho disso, porque prefiro a solidariedade à disputa, mas sei que se trata de uma limitação, porque o mundo real é movido pelo atrito.

Eis-me então escolhido patrono para a Feira, a nossa Feira. Tenho tentado pensar no que posso fazer de relevante, algo que vá além da minha evidente satisfação pessoal (ser escolhido patrono é um pouco contradizer o dito de que ninguém é profeta em sua aldeia).

E desde logo me coloquei a perspectiva de, sendo patrono, pensar como o que sempre sou, na minha condição mais fundamental: a de leitor. Me considero, então, um delegado, um deputado, um embaixador do leitor – daquele que já é leitor maduro e sereno, mas também daquele que ainda não é, mas pode tornar-se, tem o direito de vir a ser.

A Feira do Livro de Porto Alegre é muito mais do que uma feira de venda de livros; é muito maior do que a soma dos interesses particulares (e cabíveis) que entram em jogo; ela é um momento sublime da cidade e do Estado, e mesmo do país; ela é um ponto de encontro entre inteligências, vontades, fantasias e a mercadoria chamada livro, que é mais do que uma mercadoria.


Como disse uma vez Jorge Luis Borges, todos os instrumentos criados pelo homem são uma extensão de sua mão (ou de seu olho, acrescento), enquanto o livro é uma extensão da imaginação. Da imaginação sem a qual a gente não sai da cama de manhã, não ama, não educa, nem faz as mudanças sociais necessárias.