25 de setembro de 2013 | N°
17564
EDITORIAIS ZH
PICHAÇÃO
VERBAL
A presidente Dilma Rousseff cumpriu o que prometera:
aproveitou a oportunidade de abrir a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova
York, ontem, para manifestar numa tribuna internacional o seu desconforto com a
espionagem eletrônica praticada pela agência de segurança dos Estados Unidos
(NSA) em assuntos internos do Brasil.
De forma contundente, atacou a política norte-americana de
desrespeito à soberania das outras nações. Imiscuir-se dessa forma na vida de
outros países fere o Direito Internacional e afronta os princípios que devem
reger as relações entre eles, sobretudo, entre nações amigas alfinetou a
presidente brasileira, que há poucos dias cancelara uma visita oficial aos
Estados Unidos em represália à bisbilhotice denunciada pelo ex-agente da CIA
Edward Snowden, atualmente exilado na Rússia.
Dilma fez questão de lembrar a investida sobre a Petrobras
para evidenciar que as ações não se restringem à defesa da segurança nacional e
ao combate ao terrorismo, como alegara o presidente norte-americano. Ainda
assim, na opinião da primeira mandatária do país, seria intolerável: Jamais pode
o direito à segurança dos cidadãos de um país ser garantido mediante a violação
de direitos humanos e civis fundamentais dos cidadãos de outro país
afirmou.
Apesar da contundência da manifestação, a queixa brasileira
recebeu apenas um breve comentário do presidente Barack Obama, que também falou
na abertura do evento e centrou seu pronunciamento no programa nuclear iraniano
e na guerra civil da Síria. Sobre a suposta espionagem, ele disse apenas que os
Estados Unidos começaram a rever a maneira como obtêm dados de inteligência para
poder balancear segurança e privacidade.
O Brasil tinha direito de fazer essa pichação verbal. Dilma
Rousseff, porém, pretende transformar o incidente com os Estados Unidos numa
ação global de regulação da transmissão de dados para evitar a guerra
cibernética que, no seu entender, está prestes a ser deflagrada. Para isso,
propôs que a ONU assuma a liderança de um esforço para regular o comportamento
dos Estados frente às novas tecnologias, de modo que a internet contemple, ao
mesmo tempo, liberdade de expressão, segurança e respeito aos direitos
humanos.
De boas intenções, o inferno virtual também está cheio.
Difícil é saber como tornar factível uma proposta tão ambiciosa e tão
desconectada da realidade. Para que o pronunciamento da presidente brasileira
não seja interpretado apenas como marketing eleitoral, destinado a reforçar
anacrônicos sentimentos nacionalistas e antiamericanos, o discurso de ontem terá
que ser seguido de um plano concreto de proteção dos dados domésticos e de uma
proposta viável para o regramento da internet. Seremos capazes disso?