domingo, 29 de setembro de 2013

ELIANE CANTANHÊDE

A volta dos que não foram

BRASÍLIA - O Brasil, que se vangloria, com boas razões, dos avanços dos últimos 20, 30 anos, corre o risco de ter, simultaneamente, um preso na Papuda com mandato de deputado, um presidente do Senado que foi enxotado por denúncias e voltou ao cargo, três condenados pelo Supremo mantendo o mandato e um governador que foi destituído, preso e, agora, é de novo candidato.

O tal Natan Donadon foi parar na cadeia por ordem do Supremo e manteve o mandato pelo voto dos colegas da Câmara. O presidente do Senado que saiu e voltou é Renan Calheiros. Os condenados pelo Supremo com mandato, um ou outro com assento na Comissão de Constituição e Justiça, todo mundo sabe quem são.

E quem é o governador do qual tratamos aqui? É o ex-governador José Roberto Arruda, do Distrito Federal, flagrado com a boca na botija no chamado "mensalão do DEM".

Arruda --que, no início, tinha tudo para dar certo-- já era reincidente a essas alturas. Tinha se enlameado no Senado, teve a segunda chance e afundou de vez no governo do DF.

Mas será que afundou de vez mesmo? Ele foi afastado do cargo e preso na mesma Papuda que agora hospeda Donadon, mas acaba de ter as contas do seu governo em 2008 aprovadas pela Câmara Distrital, enquanto a Justiça empurra com a barriga, como faz em geral com poderosos.

Por isso, Arruda já emerge, põe o nariz de fora e fareja a possibilidade de se filiar ao PR para concorrer a qualquer cargo em 2014. Pode? Sei lá. Ele e o presidente do partido no DF acham que sim, alegando que, se todo o mundo pode, por que ele não?

Por falar em "todo o mundo", a revista "Congresso em Foco" acaba de concluir um levantamento mostrando que, de cada dez parlamentares, quatro estão enrolados no Supremo Tribunal Federal --que é o foro privilegiado (bota privilegiado nisso!) dos que têm mandato. São 224 deputados e senadores respondendo a 542 inquéritos e ações penais.

É desanimador...O mais afoito dos dois (aquele acusado de acelerar) sugere descolarem a parte que engrouvinhou e colar de novo. O mais cauteloso (o acusado de atrasar) discorda. O afoito, contudo, não quer nem saber e puxa o papel: as bolhas e estrias somem, assim como uma faixa de 1,20 m x 10 cm de tinta e massa corrida, arrancada pelo adesivo.


O afoito tenta colar de novo, mas o volume das cascas de tinta e massa corrida fica evidente --parece um tapete estendido sobre a areia da praia. Vocês olham a parede. Só 30 cm do primeiro rolo foi aplicado. Ainda faltam 35,7 m. Vocês se olham. Estão juntos há seis anos. Pensavam em ter filhos, em fazer pão em casa aos domingos, tomar banhos de banheira, visitar a Pinacoteca e quem sabe até, um dia, forrar aquele quarto com um belo papel de parede.