segunda-feira, 30 de setembro de 2013


30 de setembro de 2013 | N° 17569
KLEDIR RAMIL

Ô, sorte

Minha amiga Dani foi buscar a filha na escola e ficou sabendo que as aulas haviam sido suspensas por conta de uma situação desagradável que havia acontecido. Como estavam às vésperas do Dia do Pais, a atividade de classe para as crianças, naquele dia, era recortar um pedaço de cartolina, fazer um cartão com um desenho de próprio punho e escrever uma mensagem bonita. O problema começou quando uma das meninas da sala perguntou para a professora como deveria fazer, já que sua mãe é casada com outra mulher.

A professora ficou atrapalhada e, sem saber como conduzir a conversa, retirou a menina de sala e foi até a diretora, que coçou a cabeça e resolveu pedir a ajuda da psicóloga. Conclusão: as mães da menina foram chamadas e, ao depararem com aquele imbróglio humilhante, de inacreditável falta de tato, botaram a boca no trombone e decidiram procurar outra escola para a filha. Com toda razão.

Minha amiga aproveitou a oportunidade e, no caminho de volta para casa, abriu uma conversa séria com a filha, tomando uma série de cuidados para não tropeçar nas palavras.

– Querida. Hoje em dia existem famílias diferentes, que não são assim como a nossa, um pai e uma mãe. Algumas mães criam os filhos sozinhas, outras casam de novo e as crianças ganham outros irmãos, filhos do novo pai. Às vezes, os pais se separam e as crianças passam a viver em duas casas. Um pouco lá, um pouco cá.

Seguiu naquela ladainha, cheia de explicação, tentando conduzir um papo-cabeça e a guria quieta, só escutando.

– Então... Há situações em que o pai fica com a guarda dos filhos, ou a mãe, ou os avós. E há outros modelos de casal, com outro tipo de relação afetiva, quando o pai arranja um namorado, ou a mãe casa com uma outra mulher. É o caso da tua amiguinha...

A filha, que até então estava em silêncio, finalmente se manifestou. Arregalou os olhos, abriu um enorme sorriso e gritou:

– Ô, sorte. Já pensou? Duas mães e nenhum pai.


Meu amigo Bob, marido de Dani, quando ficou sabendo do comentário da filha, entrou em depressão profunda. Mas sobreviveu e já está melhorando. Tem recebido acompanhamento psicológico e vem superando tudo com a ajuda de medicamentos.