sábado, 28 de dezembro de 2013


29 de dezembro de 2013 | N° 17658
O CÓDIGO DAVID | DAVID COIMBRA

TODA NUDEZ SERÁ REDIMIDA

Houve um toplessaço no Rio, semana passada. As mulheres desabotoaram as blusas e ganharam as ruas literalmente de peito aberto, gritando que elas também têm o direito de sair por aí sem camisa.

Concordo.

Sou a favor de mulheres de torso nu. Se elas quiserem andar com-ple-ta-men-te nuas, também não veria problema algum, desde que se resguardassem de resfriados. O vento encanado, por exemplo, é um perigo, quem já teve avó sabe. Eu mesmo andaria pelado, se não me ressentisse da falta de bolsos, bolso é coisa muito útil.

O que é que tem em alguém andar nu? Na praia, para onde você vai agora nas férias, na praia as mulheres tapam o cóccix, e quase nada mais. Se aquele cóccix está tapado, ninguém se escandaliza. Mas a mesma mulher, quando na cidade, pode expor o cóccix livremente, uma vez que cubra as nádegas. Qual é o critério? Só pode um de cada vez?

Aqueles caras que publicam fotos deles mesmos sem camisa nas redes sociais. É ridículo, é patético, mas ninguém reclama. Agora vá uma menina fazer o mesmo. O Facebook é capaz de cancelar a conta dela. O Facebook é muito moralista.

Aí está: a moral. A moral é relativa. A Fernanda Lima, que apresenta exatamente um programa sobre sexo na TV, pois a Fernanda Lima apareceu gloriosa na transmissão do sorteio dos grupos da Copa do Mundo. Estava dentro de um vestido justo como o caminho do bem, com um decote profundo como a filosofia de Kant, estava sinuosa e dourada como a serpente que se enrolava na macieira do Paraíso. Linda, linda, Fernandinha.

Ocorre que, no distante Irã, o decote da Fernanda Lima provocou tal excitação que o governo o censurou. Gravou o evento e o apresentou com o colo da Fernanda Lima devida e pudicamente coberto.

Aquele era um colo perigoso. No Irã, as mulheres estão lutando para sair à rua sem ter que cobrir os cabelos. Imagina se vissem como se vestem as ocidentais. Imagina se soubessem que, por aqui, a luta das mulheres é para sair à rua sem ter que cobrir os seios.

O vale do entresseios da Fernanda Lima abalou o governo do Irã e fez estremecer os aiatolás. Era um vale do sacrilégio. Um vale do pecado.

Sim, senhor, um pedaço de corpo de mulher, se bem usado, pode acender uma revolução.


10 livros para o verão
Leitores pedem indicações de livros para as férias.

Certo.

Vou listar 10 infalíveis. E, quando digo infalíveis, quero dizer infalíveis. Se você ler qualquer um desses livros, terá uma experiência elevada no verão que chega com suas mulheres de cóccix cobertos e nádegas expostas e, quiçá, seios expostos também.

Não cultivo preconceitos ideológicos. Admiro a civilização norte-americana e seus autores vigorosos. Portanto, vou sugerir nove livros de escritores do Grande Irmão do Norte e um do México. Faço tal deferência ao México não por acaso, senão porque seu ex-presidente, o bigodudo Porfírio Diaz, um dia suspirou:

– Pobre México: tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos.

Quer dizer: minha indicação é um desagravo ao México tão oprimido. Ao mesmo tempo, quando cito essa frase célebre, faço também uma concessão aos esquerdistas que odeiam os ianques. Assim, com todos contentes, apresento minha lista:

1. Ragtime

de E. L. Doctorow.

Esse livro... sinta o ritmo desse livro. Você vai dançar com Doctorow. Você vai dançar o ragtime.

2. As Vinhas da Ira

de John Steinbeck.

Um dos mais belos e comoventes finais de romance da história. Um livro poderoso, convertido em um lindo filme estrelado pelo grande Henry Fonda.

3. O Longo Adeus

de Raymond Chandler.

Um clássico do romance noir, com Phillip Marlowe, o maior dos detetives cínicos de todos os tempos. Eu queria ser Phillip Marlowe.

4. Um Bonde Chamado Desejo

de Tennessee Williams.

É uma peça de teatro. Um texto seco e forte. Marlon Brando interpretou o protagonista da peça no cinema, e fez história, como sempre fazia Marlon Brando.

5. Moby Dick

de Herman Melville.

Essa é das mais rutilantes pedras preciosas da literatura ocidental. Também virou filme, com Gregory Peck.

6. Factótum

de Charles Bukowski.

Dos mais divertidos livros do Velho Buk. Quando o li, parecia estar lendo sobre um trecho da minha vida.

7. Bonequinha de Luxo

de Truman Capote.

Aprendi muito com este pequeno romance. Capote é autor da frase que, para mim, resume o ato de escrever bem: “Eu quero construir uma frase maleável e resistente como uma rede de pescar”.

8. Espere a Primavera, Bandini

de John Fante.

Fante era o ídolo de Bukowski. Certa feita, bêbado, como soía acontecer, o Velho Buk gritava: “Eu sou Arturo Bandini! Eu sou Arturo Bandini!”

Eu também sou. Sou Phillip Marlowe e Arturo Bandini.

9. Fique Quieta, Por Favor

de Raymond Carver.

Uma vez, o cônsul do Japão me disse que eu escrevia parecido com Carver. Fiquei todo bobo, porque todos queriam ser Raymond Carver. Ou Arturo Bandini. Ou Phillip Marlowe.

10. Festa no Covil

de Juan Pablo Villalobos.


Eis o mexicano da turma. Festa no Covil é uma novela pequena, de 80 páginas, que você lê de uma única vez. É uma história bela e cruel que vai fazer com que você esqueça até os melhores cóccix da orla.