terça-feira, 16 de setembro de 2014


16 de setembro de 2014 | N° 17924
DAVID COIMBRA

É TEMPO DE MUDA

Há poltronas pelas esquinas das cidades americanas, neste setembro. E colchões no meio-fio também, muitos colchões, e mesas e cadeiras e estantes e armários. É que setembro marca o começo de nova temporada no Hemisfério Norte. O verão está terminando, o ano letivo está começando e o tempo muda lentamente. Por conta disso, aprendi um termo em inglês. Uma americana me disse que está sentindo um hint de outono. Maldição. O que seria hint? Ela explicou que hint é um traço, uma insinuação, uma sugestão de outono.

O outono se insinua.

Para mim, já chegou. Faz um frio gaúcho em Boston.

Agora, isso das poltronas, isso acontece porque, na mudança de temporada, os americanos também se mudam. Há muitos calouros chegando às várias universidades bostonianas e muita gente trocando de apartamento, porque os contratos de aluguel terminam agora. Há, também, muita gente que está concluindo a reforma de casa – eles aproveitam o verão para fazer reformas e deixar a casa preparada para o inverno duro que virá. Assim, sobram todos esses sofás e colchões, e você pode ver os jovens pegando móveis nas calçadas e levando para seus alegres apartamentos de começo de vida.

É tempo de muda no Hemisfério Norte e, pensando bem, não é diferente no Hemisfério Sul. O São Paulo de Kaká, Ganso e Pato começa a mostrar que é melhor. Sinto um hint de novidade no Brasileirão. O Cruzeiro não resistirá na ponta até o fim da primavera.

O ZAGUEIRO QUE NÃO RI
Uma vez entrevistei o Felipão a respeito de seus tempos de zagueiro. O Felipão tem fama de ter sido um zagueiro tosco e até meio violento. Um zagueiro que não ria.

Lembro de tê-lo visto jogar naquele timaço do Caxias, ao lado do Cedenir e à frente do Bagatini. Francamente, o Felipão não me parecia tão carente de habilidade como se consagrou no país depois que ele se tornou treinador.

Perguntei-lhe sobre isso, e ele contou:

– Comecei meio que sendo mesmo um zagueiro tosco. Dava chutão, não queria saber. Mas, depois, fui ganhando confiança e aí já saía jogando, já me arriscava mais. Até que me senti um zagueiro com boas qualidades.

Aí está. Felipão está tentando fazer o mesmo com os zagueiros do Grêmio. Rhodolfo já adotava a política da segurança total, tão saudável para quem joga na grande área defensiva. Rhodolfo já é um dos melhores zagueiros do Brasil. Quem ganhou com a chegada de Felipão foi Geromel. Esse zagueiro tem sofisticado seu estilo de jogo a cada partida. Contra o Atlético, em BH, conseguiu sua melhor atuação. Foi o destaque do jogo. Não se pode dizer que seja um jovem, está com 28 anos, mas não existe limite de idade para se aprender.

O ZAGUEIRO QUE RIA

É verdade que zagueiro com técnica, zagueiro risonho às vezes se torna temerário. Zagueiro não é para jogar bola, é para evitar que se jogue bola.

Há, no Brasil, exemplos ilustres de zagueiros boleiros. Domingos da Guia, o “Divino Mestre”, pai de Ademir da Guia, o “Mestre”, saía driblando todo mundo dentro da área. Dava balãozinho e janelinha em atacante, e quase matava a torcida de susto, tanto que inconsequências de zagueiros passaram a ser conhecidas como “domingadas”.

O Grêmio teve um zagueiro que até colorados diziam ser o maior e melhor de todos os tempos: Aírton Ferreira da Silva, o Pavilhão. Pois Aírton não batia em atacante, não dava chutão e dele dizem que não se deu bem na Seleção por ter feito aquele lance de letra que fazia no Grêmio: ia até a bandeira de escanteio e, de letra, mandava a bola por cima da cabeça do atacante, nas mãos do goleiro. Ele fez isso com Pelé. Não pegou bem.


Não vi Aírton e Domingos em ação. Talvez por isso prefira um Figueroa, que, se estava longe de ser limitado, nunca foi um doce dentro da grande área. A grande área é lugar de respeito. Na grande área não se ri.