quarta-feira, 18 de dezembro de 2019



18 DE DEZEMBRO DE 2019
DAVID COIMBRA

O nazista de Unaí

Tem um nazista lá em Unaí. Para falar a verdade, eu não conhecia Unaí. Nem sabia que existia, tive de chamar o Google. Situa-se em Minas Gerais, no centro do Brasil, e é habitada por precisamente 83.808 seres humanos. Um desses, nazista.

Dias atrás, ele botou sua braçadeira com suástica e foi para um bar do centro da cidade. Sentou-se em frente a uma mesa, sozinho, e ali ficou. Os outros clientes se espantaram, alguém chamou a polícia, mas nada aconteceu. Depois de algum tempo, ele se levantou e foi embora sem ser importunado.

Mais tarde, a imprensa descobriu a identidade do homem: ele é um pecuarista conhecido como Zeca Adjuto. Resumindo: estamos falando de um nazista brasileiro que se chama Zeca.

É muito interessante, chega a ser admirável, porque o nazismo não existe sem o conceito de supremacia racial ariana. Quer dizer: para o nazismo, só o que importa é a etnia germânica. Todos os demais povos são subalternos a ela e por ela podem ser até escravizados. Logo, um brasileiro ser nazista é uma contradição em termos. É como um negro querer entrar na Ku Klux Klan. Hitler, se vivo estivesse, nem sequer aceitaria um brasileiro no seu partido.

Tenho cá a suspeita de que o nazista de Unaí não é um fenômeno isolado: ele é apenas mais um que foi contaminado por uma grande enfermidade que está assolando o Brasil. Há outros como ele, e não necessariamente nazistas. Há, por exemplo, brasileiros que pedem a volta da ditadura. É o mesmo sintoma. Povos do mundo inteiro lutaram e lutam pela liberdade, pela autodeterminação, pela democracia. E os brasileiros, tendo conquistado tudo isso, clamam pela submissão. É como se alguém pedisse:

- Mandem em mim! Quero obedecer calado e, se desobedecer, quero ser punido severamente! Um tirano! Preciso de um tirano!

Por que isso? Masoquismo? É uma possibilidade. Leopold von Sacher-Masoch, não sei se você sabe, viveu no século 19, na Áustria. Era, portanto, ariano legítimo, conterrâneo de Hitler. Quando tinha oito anos de idade, ele entrou em um armário para brincar e, lá de dentro, ouviu que sua tia e o namorado se aproximavam. Os dois se beijavam e se acariciavam e logo se jogaram na cama e começaram a fazer amor. O pequeno Leopold, vendo tudo pelo buraco da fechadura, ficou tão excitado, que emitiu ruídos estranhos. A tia, assim, o descobriu, puxou-o para fora do esconderijo, baixou-lhe o calção e passou-lhe um corretivo. Pronto. A vida de Leopold mudaria para sempre. Depois disso, ele só encontraria prazer sexual se a mulher primeiro o submetesse e depois o espancasse. Não é bem assim que se comportam os brasileiros nazistas ou os que pedem pela volta da ditadura?

Mas também poderia ser excesso de modéstia? Os brasileiros teriam chegado à conclusão de que são inferiores a outros povos, de que não têm competência nem para governar a si mesmos e, por isso, passaram a reivindicar a opressão? Pode ser isso? Estaríamos sendo humildes em demasia?

É preciso tomar cuidado. Porque, às vezes, por mais absurdo que pareça, você pede algo e acaba conseguindo.

DAVID COIMBRA

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