sábado, 14 de agosto de 2021

14 DE AGOSTO DE 2021

FLÁVIO TAVARES

CULPA E PERDA

A constatação é aterradora: a temperatura da Terra está mudando mais rápido do que se previa e pode atingir 1,5 grau acima do nível pré-industrial já em 2030, 10 anos antes do esperado. Os dados são do Painel Intergovernamental do Clima, da ONU, dias atrás, e revelam que continuamos surdos às advertências da ciência sobre o crescimento das emissões de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa.

As consequências do horror já se fazem sentir no Brasil, com secas e estiagens e gélidas temperaturas no atual inverno, alternadas com inesperado calor. Isto leva a produção agrícola ao caos com a consequente escassez de alimentos. O secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, definiu as conclusões do painel como "o sinal vermelho" sobre a vida no planeta.

Nos últimos anos, avançamos 1,1ºC na temperatura média global. Um novo aumento de apenas 0,4ºC produzirá secas severas, ondas de calor, chuvas torrenciais, incêndios e tempestades, com aumento do nível do mar. E tudo isso em tempo menor do que o previsto.

O Painel Intergovernamental sobre o Clima lembra ainda que uma queda severa nas emissões de dióxido de carbono (CO²) pode mitigar o avanço do aquecimento da Terra. "Mas terá de ser global, profunda e em todas as áreas", frisa, lembrando que o aquecimento aumenta de velocidade ao crescer.

No Rio Grande e no Brasil, seguimos surdos e cegos, porém, como se os culpados não fôssemos nós ao permitir o horror. Aqui no RS, as mudanças no Código Ambiental, propostas pelo governador, mostram o desdém do poder público sobre o meio ambiente. A tentativa de abrir uma mina de carvão a céu aberto, à beira do Rio Jacuí em terreno de banhado a 14km da Capital (que destruirá cultivos de arroz orgânico e hortaliças sem agrotóxicos), revela também o desprezo pelo abastecimento de água na Região Metropolitana.

Tudo isso está interligado, num somatório que incide diretamente no aumento da temperatura do planeta, num suicídio coletivo perpetrado pela cobiça.

Com a morte de Paulo José Gómez de Souza, não perdemos só um grande ator de teatro, TV e cinema. Mais do que tudo, desaparece alguém coerente e profundo, no qual a arte era uma forma de se expressar diante das injustiças do mundo.

Politizado e com profunda visão social, sem o exibicionismo tão comum na arte cênica, Paulo José encabeçou a geração de gaúchos que, a partir dos anos 1960, revolucionou o teatro e o cinema no país. Com a morte do velho amigo, é como se eu perdesse também uma parte de mim.

Jornalista e escritor - FLÁVIO TAVARES

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