terça-feira, 9 de dezembro de 2014


09 de dezembro de 2014 | N° 18008
LUIZ PAULO VASCONCELLOS

AS POSSIBILIDADES PERDIDAS

Está terminando o ano em que Shakespeare estaria fazendo 450 anos de vida não fosse esse bendito acontecimento que todos nós vamos ter que enfrentar um dia chamado Morte. Por que bendito? Porque, não fosse a finitude, esta vida seria um tédio, um tédio eterno, sem objetivos, sem surpresas, sem novidades, sem criatividade, sem imaginação, sem possibilidades. Já pensaram o que seria acordar, tomar café, ler o jornal e tudo mais que fazemos o dia inteiro, todos os dias, durante 450 anos?

E se permanecesse a legislação que regulamenta as aposentadorias, tudo seria ainda muito pior. Fazer, criar, inventar, consertar, produzir, concordar, discordar e depois voltar a discordar, concordar, produzir, consertar, inventar, criar e fazer tudo de novo, eternamente, sempre. Ainda bem que um dia morreremos, realizados e felizes.

Claro, há aqueles que vão cedo demais, seja por acidente, excesso de drogas, assaltos, depressão, suicídio e outras muitas possibilidades imprevisíveis e fatais, sem contar os raios, os vendavais, os ciclones, os tsunamis, as erupções vulcânicas, as ondas sísmicas, os maremotos e, por outro lado, as guerras, as bombas, os fuzilamentos, as revoluções.

Aqueles que não tiveram tempo de saborear as raras vantagens que a idade nos oferece, como é o caso das vagas para idosos. Por esses, sim, devemos lamentar as possibilidades perdidas. Mas nós, que vimos o Zeppelin, já podemos nos dar por satisfeitos pelos muitos filmes que passam na tela da nossa memória.


Voltando a Shakespeare, pergunto: se o Bardo vivesse até hoje, teria se adaptado aos diversos movimentos que marcaram a evolução/involução da arte – naturalismo, realismo, simbolismo, surrealismo, dadaísmo? Seria hoje um pós-moderno vangloriando-se de sua liberdade quase incondicional? Concordaria com o lema de que “forma é conteúdo”? Pobre Shakespeare. Ainda bem que só viveu 52 anos. Mas nesse pouco tempo criou a obra dramatúrgica mais genial de toda a história da humanidade.