sábado, 30 de novembro de 2013


30 de novembro de 2013 | N° 17630
CLÁUDIA LAITANO

Mala do ano

A Rússia tem funcionado para o Brasil como uma espécie de irmão mais velho aprontão que faz o caçula cabeça oca parecer um anjinho por comparação.

Sim, o trânsito no Brasil é um inferno, mas em Moscou, acreditem, é ainda pior – em abril, uma empresa especializada em tecnologia de GPS classificou a capital russa como a cidade com os piores engarrafamentos do mundo. Sim, aqui a gente tem racistas e homofóbicos na Comissão de Direitos Humanos do Congresso, mas a Rússia tem um presidente que manda prender feministas e militantes do Greenpeace.

Nossos milionários não são exatamente educados em Lausanne em termos de bom gosto, mas magnatas russos parecem saídos de uma ópera bufa com orçamento ilimitado para excentricidades.

Se bem que na categoria mau gosto espetacular, temos que tirar o chapéu também para a África do Sul, onde foi inaugurado um hotel temático para turistas que desejam ter uma boa ideia de como é a vida em uma favela sem precisar sujar os sapatos em um bairro pobre de verdade. (Shanty Town, o hotel-boutique maloqueiro, fica na cidade de Bloemfontein, se você ficou interessado.)

Em Porto Alegre, o tatu da Coca-Cola, instalado no Largo Glênio Peres para celebrar a Copa do Mundo, incomodou tanto, que terminou do jeito que todo mundo sabe: murcho e compulsoriamente aposentado. Pois em Moscou, a Louis Vuitton acaba de bater todos os recordes na categoria marketing extravagante em locais públicos ao plantar uma reprodução gigantesca (30m x 9m) da mala mais famosa do mundo em plena Praça Vermelha, a alguns metros do mausoléu de Lenin.

Para além do evidente simbolismo político e histórico, a mala gigante tornou-se uma espécie de monumento involuntário ao capitalismo deslumbrado, uma Torre Eiffel do consumismo sem limites e sem noção. (Enquanto escrevo, o caixotão VIP ainda está lá, tapando a vista de prédios históricos, enquanto a expedita burocracia russa decide de quem é a culpa e quem vai convidar os malas a se retirarem. Cadê Gogol numa hora dessas?)

No fim de semana em que os brasileiros foram bombardeados com ofertas de promoções fajutas da infame Black Friday nacional, que simula descontos e insulta a inteligência do consumidor, convém meditar sobre as lições que o novíssimo capitalismo russo está nos enviando: se o nosso modelo, como o deles, é o do consumismo pujante e sem culpa dos americanos, era bom caprichar um pouquinho mais no acabamento da nossa Louis Vuitton de camelô.


A propósito: se dependesse de mim, o troféu “mala do ano” não seria da Louis Vuitton, mas dos spams da Black Fraude brasileira.