terça-feira, 7 de fevereiro de 2017



07 de fevereiro de 2017 | N° 18762 
CARPINEJAR

Mãe que é mãe

Mãe que é mãe, mas mãe mesmo, diplomada e pós-graduada, tem que possuir uma receita de família e fazer charme para contar. Uma receita que herdou e agora é só dela. Uma receita caseira, inescrutável, que não passa para ninguém, que não anotou em livro nenhum, que muda de assunto na hora de entregar os ingredientes e o preparo aos filhos. Uma receita que permanece na tradição oral e que é capaz de mudar o mundo, o destino de um casamento, recuperar uma amizade, resolver a arenga entre judeus e palestinos, desfazer depressão e mau olhado.

É uma receita divina, de dar água na boca e também umedecer os olhos.

Pode ser uma sopa de tomate, uma pizza alta, um quibe, um arroz-doce. Quanto mais simples, maior a magia.

Sabe aquele pudim de claras perfeito? Tipo isso. Uma receita que a parentela inteira espera com suspense, que se transforma em presente de aniversário e coroação de datas festivas. Uma receita que não é feita sempre, que não é banalizada, mas só realizada depois de muito apelo e insistência.

E daí a mãe coloca o avental e fecha a porta da cozinha para ninguém observar. Só escutará o barulho das panelas e será envolvido pelo cheiro de baunilha escapando pelas frestas. Talvez a senha seja caramelar a fôrma. Talvez seja a batida dinâmica das claras para triplicar o tamanho. Talvez seja o pouso das claras batidas na fôrma com aquele estampido seco que anuncia o sucesso. Talvez. Não se sabe, ela não confessa, e todos ficam fantasiando o truque.

Uma receita que é a fórmula da Coca-Cola, que é o último segredo de Fátima, que é a profecia de Nostradamus, que a mãe promete um dia revelar ao filho e ele fica se comportando o resto da vida aguardando o instante de merecimento. Não duvide que aconteça somente no último suspiro, nas derradeiras palavras, quando o filho com caneta e caderninho à beira do leito de morte anota às pressas, torcendo para que ela tenha força para terminar a frase.

Mas não é qualquer pudim, mas O PUDIM, simétrico, escandalosamente bonito, com a calda escorrendo como a neve nas mais altas montanhas do Nepal. O pudim que sugere ter sido criado num feitiço, a ser medido com uma régua e esquadro, comprovando que os dois lados apresentam os mesmos centímetros de comprimento e de altura.

Mãe quando é mãe de verdade tem uma receita de estimação que não abre. Guardar o mistério é o que lhe confere o status de toda poderosa Nonna.