terça-feira, 19 de abril de 2016



19 de abril de 2016 | N° 18503 
DAVID COIMBRA

Os deputados malvados

Estive em Porto Alegre na semana passada e constatei que as pessoas não saem mais às ruas de medo de serem assaltadas por deputados. Muitos deputados inclusive são cruéis: eles não apenas roubam, mas sequestram, espancam e até matam.

Outros deputados derramam ácido no leite das criancinhas, para lucrar mais na venda.

E há deputados que se embriagam, promovem rachas nas ruas e atropelam as pessoas nas calçadas.

Ninguém me disse que são os deputados que cometem esses crimes. Concluí quando vi a reação dos brasileiros ao comportamento dos parlamentares durante a votação do impeachment de Dilma.

Os brasileiros dizem que a qualidade de seus deputados é péssima. Não percebem que, quando olham para eles, estão vendo a si mesmos. Estão vendo o seu próprio reflexo no espelho.

De fato, houve muitos momentos patéticos durante os breves discursos de votação. Os pontos mais baixos, não por acaso, foram patrocinados por dois extremos. O deputado Jean Wyllys desferiu uma cusparada no deputado Jair Bolsonaro dentro do plenário da Câmara. Não é possível que alguém aceite isso como algo correto. Jean Wyllys tem de ser punido por falta de decoro parlamentar, no mínimo.

E Jair Bolsonaro, ao proferir seu voto, homenageou um torturador da ditadura militar. Cheguei a sentir uma leve náusea ao ouvir aquilo, por Deus. Um deputado ir ao plenário para defender a tortura, manifestando-se num evento que está sendo observado pelo mundo inteiro! E ainda há quem chame um tipo desses de “Bolsomito”.

É triste, mas esses somos nós brasileiros. Duvida? Vá às suas redes sociais. Nunca os adjetivos “idiota” e “imbecil” foram tão empregados por nossos compatriotas.

Não existe ponderação possível, não existe argumentação. Existe fúria.

Fiquei decepcionado com muita gente, nesse processo, mas não surpreso. Sei bem que os instintos explodem nas derrotas, não quando tudo está bem.

Mas há uma ressalva, nessa situação aparentemente desesperadora: é o povo. Sabe onde estava o povo, quando tudo isso acontecia? Assistindo ao Silvio Santos.

O Programa Silvio Santos não transmitiu um único flash da votação; seguiu seu curso normal, de todos os domingos. E voou Ibope acima, batendo a Record e alcançando o segundo lugar.

Isso diz muito de grande parte do país, justamente a parte com a qual os intelectuais em debate enchem a boca: o povo.

O povo, o povo, eles gostam de falar do povo. O PT não é nem jamais foi o partido do povo. É um partido de sindicatos, entidades como o MST e de intelectuais fascinados com a mística esquerdista do operário no poder. Já os inimigos do PT tampouco são esse “povo” espoliado que o PT jura defender. São trabalhadores, sim, mas da classe média.

O “povo” não está nem aí. O “povo” quer viver sua vida, pouco lhe importando se o presidente é Temer, Dilma, Aécio, Lula ou Obama. Lamentavelmente, também é esse “povo” que vota em figuras exóticas como Wyllys, Bolsonaro e outros que tais que discursaram no domingo homenageando suas próprias mães ou Leonel Brizola, político que, se vivo fosse, poderia estar em ambos os lados – lembre-se de que, em 1992, ele ficou com Collor.

O que podemos fazer a respeito?

Nada. É preciso apenas ter paciência e esperar que a democracia siga em seu lento passo civilizatório.