segunda-feira, 13 de junho de 2016


13 de junho de 2016 | N° 18554 
CELSO LOUREIRO CHAVES

DEPOIS, O SILÊNCIO


Sim, na música de concerto há aplausos que não são bem-vindos. Reza o dito popular que a recompensa do artista é o aplauso. Nem sempre, embora sejam poucas as vezes em que bater palmas é visto – e ouvido – como quebra de protocolo. Mas também é verdade que nas pequenas coisas e nas poucas vezes, nos atos mínimos e raros, reside o potencial para o desastre.

O pianista inglês Paul Lewis que o diga. Com sua larga experiência de músico que vai daqui para lá (esteve em São Paulo há pouco) e registre isso e aquilo (é especialista em Beethoven e Schubert), observou numa entrevista para a BBC que “no final da sonata op. 111 de Beethoven, depois do acorde de dó maior, deveria haver 30 segundos de silêncio”. Aí está: os momentos desastrados de aplausos fora de hora ocorrem em peças específicas e, geralmente, no final. Lewis até acrescenta que, se apenas uma pessoa não conseguir se conter e começa a bater palmas, “a coisa toda desmorona”.

Que coisa é essa que desmorona? A magia, o momento em que a música reverbera para além da própria música, o instante em que o ouvinte vai retornando aos seus pensamentos pessoais, talvez enriquecido pelas palavras bem apanhadas que o compositor terá dito através dos sons.

Se o final da peça é muito trovejante, não há como segurar o aplauso quase instintivo. Porém, se a concentração entre intérprete, compositor e plateia for absoluta, se este círculo mágico tiver se fechado, aí até o trovão mais barulhento se aquieta.

É bizarro que o sentido de comunhão, até de pertencimento coletivo, de uma plateia possa acontecer em um instante de silêncio em que todos se combinam para ficar pensando – um momentinho que seja – naquilo que se passou. É uma combinação coletiva sem combinação, um pacto entre ouvintes e música. Aí, posso garantir, a coisa toda não desmorona. Claro que ninguém pode evitar aquele joão de molas que, nem bem terminou a música, já se põe de pé a aplaudir freneticamente, já que de pé o caminho é mais curto entre a poltrona e a porta de saída. Mas aí não se trata mais de etiqueta – trata-se de falta de educação, mesmo.