sábado, 22 de abril de 2023


21/04/2023 - 19h16min
Rosane de Oliveira

Escalada de ódio está na raiz do atraso e da violência no Brasil

Polarização política não é a única explicação para esse aparente retorno à Idade da Pedra

A intolerância que divide famílias, extingue amizades, separa casais e nos catapulta para um mundo que substituiu o diálogo pelo grito (mesmo que seja um grito virtual, em letras maiúsculas) é a mãe dessa onda de ódio que só produz violência e atraso. Quando foi que o Brasil de uma população majoritariamente cordial começou a se transformar nesse país primitivo em matéria de relações sociais? 

É verdade que o “brasileiro cordial” de Sérgio Buarque de Hollanda comporta uma série de interpretações e não deixa de ser um mito. Afinal, nossa história nestes 523 anos desde a chegada dos portugueses é feita de revoluções em que se toleravam degolas e toda sorte de violências.

Seria muito reducionista atribuir à polarização política essa sensação de retorno ao tempo das cavernas – se é que na idade da pedra lascada não havia espaço para a gentileza. Um passeio pelos comentários em redes sociais ou em sites de notícias, mesmo aqueles que só tratam de banalidades, fornece uma pista para entender a violência que está nas pontas dos dedos.

2022 teve o maior número de denúncias de crimes com discurso de ódio na internet dos últimos cinco anos 2022 teve o maior número de denúncias de crimes com discurso de ódio na internet dos últimos cinco anos 

Brasil precisa responsabilizar big techs por publicações sobre ataques em escolas, dizem especialistasBrasil precisa responsabilizar big techs por publicações sobre ataques em escolas, dizem especialistas

Temor com discurso de ódio gera debate global sobre como regular redes sociais; Brasil também é destaqueTemor com discurso de ódio gera debate global sobre como regular redes sociais; Brasil também é destaque.

Primeiro, é impressionante que em um país que precisa urgentemente aumentar a produtividade para crescer tantas pessoas se prestem para dar sua opinião em sites de notícias ou de fofocas, como se isso fizesse uma grande diferença. 

Do divórcio de um casal de subcelebridades à coroação do rei Charles III, pode-se esperar avalanches de ódio em forma de palavras, não raro escritas com erros de grafia. Quando o assunto é política, então, tirem-se as crianças da sala, porque o que não faltam são mensagens obscenas, com frequência escritas por defensores da moral e dos bons costumes (para os outros).  

Quem lida com essas correntes de ódio tem saudade do tempo em que as pessoas escreviam cartas a mão, passavam a limpo e as levavam ao correio. Porque nesse processo tinham tempo para acalmar o espírito, podar as grosserias e fazer valer as lições de civilidade. Hoje não. O sujeito  nem termina de ler um texto e já corre para o computador xingar o emissário da notícia, incluindo a família inteira, ou o autor de uma opinião da qual discorda.

Essa escalada de ódio não produz nada de positivo. Ao contrário, está na raiz do atraso e na violência que assume diversas formas. Na política, o consenso possível foi substituído pela torcida para que o governo da vez fracasse, de forma a garantir a vitória do adversário na eleição seguinte. E assim andamos em círculo, sem conseguir avançar em qualidade de vida, meta que deveria ser de todos.

Aliás

A reprodução de discursos de ódio e o compartilhamento de supostas ameaças levaram pânico às escolas, o que em nada contribuiu para aumentar a segurança dos alunos. Quem tem responsabilidade sabe que o caminho é o outro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário