quarta-feira, 13 de maio de 2015


13 de maio de 2015 | N° 18161
DAVID COIMBRA

Pelo Facebook

“Oi, David. Acho que vc não se lembra de mim. Estudei com vc no Piratini no 1° ano do 2° grau. Turma 115, uma turma cheia de bagunceiros. Eu vivia dormindo em aula, porque trabalhava à noite.”

“Mas é claro que lembro! Vc dormia mesmo. Roncava!”

“Menos nas aulas de história. Eu gostava da professora Gilda.”

“Eu também. E da Maria Antonieta, que me ensinou muito de português. Uma vez eu fiz a redação pro Ivan, aquele chileno, e o Edson, que era de Gramado. Ela leu e disse em aula: ‘Um aluno escreveu a redação pra outros dois. Eu conheço o estilo dele’. Ficamos apavorados. Quando ela entregou as provas, deu zero pra eles e 10 pra mim. Outro dia, encontrei o Ivan e ele lembrou disso. Ele toca num daqueles grupos folclóricos chilenos, sabe? Carnavalito e tal.”

“Não lembro dele. Lembro da Íria, de matemática, que era muito braba. E da Paula, de química.”

“Ah, a Paula... Tinha olhos azuis.”

“E usava calça branca.”

“Ah, a calça branca da Paula...”

“Nossa turma ganhou o campeonato daquele ano. O time tinha eu, vc, o Paulo Gordo, o Bagé...”

“Timaço! Jogava também o italiano, o Rabollini. Era bom de bola, aquele italiano.”

“Não. O Rabollini jogou no 2° ano. Ele era craque. E só tirava 10. E as gurias gostavam dele. Era bom em tudo, o Rabollini.”

“Era. Achei que o Rabollini ia ser presidente do Brasil. Hoje ele é proctologista, parece.”

“Proctologista?”

“É.”

“Que coisa. Como é a vida. Aquela nossa turma tinha todas aquelas meninas bonitas. A Neneca...”

“Neneca?”

“Uma loirinha. Baixinha. Toda direitinha. Toda empinadinha.”

“Eu gostava da Janice. Magra. Perna comprida. Cabelo crespo. Sempre séria. Um dia eu estava conversando com o João Raul na escadaria do pátio e ela veio falar com ele e subiu os degraus e parou a um palmo de mim. Um palmo! Não olhava pra mim, só olhava pra ele e falava com ele, mas eu sentia o cheiro de hortelã do hálito dela e o cheiro de chocolate branco da pele dela. Cristo! Ela acabou comigo naquele dia.”

“Janice. Era bonita. Mas ninguém ganhava da Silvia Capaverde. Eu era apaixonado por ela.”

“Era a mais bonita do colégio. Fui ao aniversário de 15 anos dela, na Casa de Portugal. Lembro que um cara mais velho dizia que namorava ela. Começou a tocar uma música do Peter Frampton. Uh, baby, I love your way, e o cara, olhando ela de longe, me disse: ‘Essa é a nossa música: minha e da Silvia. É só nossa. Sei que ela tá pensando em mim agora’. Foi ele dizer isso e a Silvia levantou e foi dançar com outro cara. Ele tomou um porre naquela noite, coitado. Não foi vc quem dançou com ela, foi?”

“Infelizmente, não. A Silvia era demais. Linda e simpática. Estava sempre rindo. Tratava todo mundo bem. Que tal fazermos uma festa da turma? Vc vai? Queria ver a Silvia de novo.”

“Ela morreu, não sabia?”

“Não! Morreu??? A Silvia??? De quê???”

“Não sei. Só sei que morreu.”

“Mas não pode. Não pode. Eu era apaixonado por ela.”

“É. Não podia mesmo. Pra mim, ela era a vida que se deve ter aos 15 anos de idade.”

“A Silvia. Eu era apaixonado por ela. Como fazer a festa sem a Silvia? Como é a vida.”

“Pois é. Bom. Vou ter que sair. Tchau.”

“Como é a vida.”


“É. Como é a vida.”