A guerra perto demais
Logo após o massacre terrorista de 7 de outubro de 2023, testemunhei em Israel o medo em seu estado mais puro. Quando desembarquei aqui, extremistas do Hamas ainda estavam infiltrados em áreas do sul do país e o grupo disparava foguetes a partir de Gaza. Existia também, é claro, uma profunda tristeza, estupefação, misturada com revolta e horror.
Ao chegar ontem de volta a Israel, vejo um país que ainda espera o retorno dos mais de cem reféns em poder dos terroristas. As faixas com os rostos dos sequestrados estão em várias partes: dos viadutos que ligam Jerusalém a Tel Aviv aos postes da dourada orla do Mediterrâneo. Ninguém foi esquecido.
Mas eu vejo, além de tudo, uma preocupação muito séria com o futuro. Muitas pessoas com as quais conversei dizem sem pestanejar: "Estamos em guerra".
O medo continua: não se sabe que horas virão os mísseis do Irã ou os foguetes do Hezbollah.
É um medo diferente. Como se trata de um conflito armado contra outro Estado - ainda que Israel negue e diga que o alvo é o grupo extremista -, o nível de preocupação é maior.
Cenário das ruas
Nesse início dos festejos do Ano-Novo judaico (Rosh Hashaná), em que crianças e adolescentes desejam "shana tova" (Bom ano), vê-se multidões nas ruas comprando flores, andando de patinete ou jogando frescobol à beira-mar menos de 12 horas depois de o país sofrer seu maior ataque em décadas. Mas essa é uma falsa sensação de que está tudo bem. Logo, observam-se helicópteros no céu.
A qualquer momento, as sirenes podem voltar a tocar e pode ser necessário correr para os bunkers. E, pela primeira vez, o Domo de Ferro, o poderoso sistema antiaéreo israelense, mostrou que tem fissuras. Os mísseis do Irã aproximaram demais a guerra de Tel Aviv. _
Voo na pior noite do Oriente Médio
Voei na pior noite para se voar pelo céu do Oriente Médio: na madrugada de ontem, horas depois da chuva de mísseis balísticos do Irã sobre Israel, o avião da Jordan Aviation no qual eu estava junto com outras dezenas de passageiros foi um dos primeiros a ingressar no espaço aéreo da Jordânia. O país vizinho a Israel ficou na rota dos mísseis, e alguns artefatos chegaram a cair perto do aeroporto de Amã.
O voo R5812 entre o Cairo e a capital da Jordânia deveria ter decolado às 23h de terça-feira. Mas, com o portão de embarque fechado desde cedo, era possível pressentir que algo estava errado. Todos os aparelhos de TV do terminal 1 mostravam o céu de Israel crivado de mísseis, a grande maioria abatida pelo sistema de defesa antiaérea. Israel sofria seu maior ataque.
No caminho dos mísseis, a Jordânia fechou o espaço aéreo.
Como viajar nesta noite? A essa altura, meu voo já estava atrasado. Pelo Flight Radar, era possível ver um imenso vazio no mapa sobre Israel e Jordânia - todas as aeronaves desviavam dos territórios. Preparei-me para não dormir mais uma noite - a terceira desde que deixei Porto Alegre, no domingo.
Perto das 2h da manhã, nós, os passageiros, fomos chamados para embarcar. A bordo do Boeing 737-300, olhares sisudos. A aeronave bem antiga gerava apreensão pelo estado das poltronas, sem apoio para o braço, e com mesinhas quebradas. O ar-condicionado só foi ligado pouco antes da decolagem.
No ar, foram 56 minutos de apreensão. Os segundos passavam lentamente. Quando o avião fez a curva à esquerda, sobre a Península do Sinai, entrando no espaço aéreo jordaniano em seguida, o olhar pela janela mirava o horizonte, onde fica Israel. Faltavam 30 minutos ainda para o pouso. Eram os momentos mais delicados. Torci para não avistar nenhum clarão no céu. E se houvesse uma nova ofensiva aérea? Ou um erro de cálculo? Daria tempo de voltar? O que fariam os pilotos?
O alívio veio quando a pista do aeroporto de Amã, já na Jordânia, apareceu na janela. O Boeing já estava bem baixo. Agora, faltavam poucos segundos. Pousamos em segurança às 3h54min em uma noite clara a contrastar com o clima sombrio da guerra. Havia poucas nuvens - mas, ainda assim, foi a pior noite para se voar pelo céu do Oriente Médio. _
Em meio à guerra, o início do Ano-Novo
Desde o pôr do sol de ontem e até sexta-feira, os judeus celebram o Rosh Hashaná, o Ano-Novo. Foi durante esse feriado que, no ano passado, o grupo terrorista Hamas promoveu o massacre contra populações próximas à Faixa de Gaza. Ao longo do dia, via-se muitas pessoas vestindo branco e carregando flores em Tel Aviv. O foco dos festejos é o silêncio e a reflexão. Os familiares dos reféns ainda em poder dos terroristas, pediram, por exemplo, que fosse observado esse objetivo.
Região está "queimando"
Em discurso no Conselho de Segurança da ONU ontem, o embaixador libanês, Nuhad Mahmud, começou sua fala pontuando que o Oriente Médio está "queimando".
Afirmou que "o povo e o governo do Líbano rejeitam a guerra" e demostrou apoio à proposta de cessar-fogo de EUA e França. Ressaltou que o conflito está se movendo em direção a uma guerra regional e irrestrita, sendo necessário "voltar" a encontrar soluções políticas. _
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