Abstenção crescente preocupa
Requer atenção a tendência de crescimento da abstenção nas eleições brasileiras nas últimas duas décadas. É preciso compreender as razões pelas quais mais eleitores aptos estão deixando de comparecer às urnas e encontrar formas de voltar a estimular o comparecimento. Em todo o país, o índice ficou em 21,7% no primeiro turno do pleito municipal nesse domingo, considerado alto para o padrão histórico pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, que também referiu a importância de se buscar entender o que está desmotivando o voto.
É verdade que foi um percentual abaixo de 2020, quando chegou a 23,1%. Mas quatro anos atrás foi reflexo direto da pandemia, quando existia o temor de contaminação pelo vírus da covid-19 em aglomerações. Olhando-se 20 anos para trás, porém, é nítida a curva ascendente da abstenção nos primeiros turnos das eleições municipais. Em 2004, foi de 14,2% e depois subiu nas quatro disputas subsequentes.
Porto Alegre foi, no domingo, a capital brasileira com o maior grau de ausência de eleitores habilitados. O percentual de 31,51% significa que quase um a cada três votantes não compareceu. Em números absolutos, foram 345,5 mil pessoas que se abstiveram, montante superior à votação do postulante à reeleição e mais votado, Sebastião Melo (MDB), merecedor da confiança de 345,4 mil eleitores.
No país, 33,8 milhões de eleitores se ausentaram no domingo. Embora não sejam eleições comparáveis, no primeiro turno do pleito geral de 2022 foram 32 milhões, um percentual de 20,89%. Mas a disputa para presidente da República, governadores, senadores e deputados estaduais e federais confirma a tendência. A abstenção cresce de forma paulatina desde 2006. Tem sido inclusive um fator incorporado nas pesquisas de intenção de voto. Passou-se a ponderar as diferentes probabilidades de determinados estratos saírem de casa para confirmar a preferência declarada.
Seria conveniente, em nome do vigor da democracia brasileira, conhecer os motivos do afastamento dos eleitores das urnas. Uma explicação sempre citada é o descrédito na política após um período de escândalos de corrupção e uma percepção de que a classe privilegia os próprios interesses e os de seus partidos. Outros fatores podem estar relacionados. Depois de Porto Alegre, o Rio de Janeiro teve a segunda maior abstenção entre as capitais. São duas das cidades com a mais alta taxa de idosos no Brasil - que, aliás, passa por um processo rápido de envelhecimento da população e, após os 70 anos, o voto deixa de ser obrigatório. De outro lado, a facilidade para justificar a ausência por meios tecnológicos como o e-título, no próprio celular, pode ser um elemento adicional a contribuir para desestimular os deslocamentos.
O fato é que as estatísticas demonstram o avanço constante das taxas de abstenção, com exceção da passagem de 2020 para 2024, distorcida pela pandemia. Ainda assim, o percentual do domingo foi 4,1 pontos percentuais acima do de 2016. Partidos, Justiça Eleitoral e cientistas políticos deveriam se dedicar a decifrar a origem do menor comparecimento e propor alternativas para voltar a elevar o engajamento no processo democrático do país.
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