sexta-feira, 2 de setembro de 2016



02 de setembro de 2016 | N° 18624 
NÍLSON SOUZA

JUÍZES

Às vezes, penso que o livre-arbítrio é que é a maldição original. Quando comemos o fruto proibido da árvore do conhecimento, como conta a historinha bíblica, uma voz interior do fundo da nossa consciência sentenciou:

– Agora, te vira sozinho!

E lá fomos nós ser gauches na vida. Bicho estranho esse, o ser humano, obrigado a tomar decisões do berço ao túmulo. Diferente dos outros animais e das outras criaturas da natureza, que já nascem com seus destinos traçados – alimentar-se para sobreviver, reproduzir-se para garantir a espécie e morrer para dar lugar ao futuro.

Nós também somos isso, mas não apenas isso. Temos que decidir cada gesto, cada passo, cada momento do nosso dia. Nosso cérebro já nasce condicionado a fazer escolhas. Os animais também fazem, pode-se argumentar, mas usam mais o instinto de sobrevivência do que essa coisa que chamamos de imaginação. Nós encucamos, elucubramos, conjeturamos, calculamos, planejamos – e muitas vezes optamos pelo pior.

O pior, para mim, é termos que julgar nossos semelhantes. Confesso que não gostaria nunca de ser juiz. Digo juiz profissional, desses que vestem toga ou uniforme para de fato julgarem seus semelhantes. Juízes informais somos o tempo todo. Olhamos para uma pessoa, conhecida ou desconhecida, e já concluímos:

– Com aquele nariz, não pode ser boa coisa...

Lembro de ter lido na adolescência uma frase de um escritor alemão, não sei se Hermann Hesse ou Thomas Mann, que define bem essa nossa vocação para avaliar o próximo:

– O homem ama e respeita o homem enquanto não consegue julgá-lo.

Julgamos e condenamos. Dificilmente absolvemos. Nas redes sociais, então, somos julgadores implacáveis. Com os outros, obviamente, porque conosco costumamos ser benevolentes.

Observe-se, por exemplo, esta reflexão que acabo de concluir: toda vez que critico o ser humano, refiro-me a nós – e não a mim. Somos juízes naturais. Dos outros.