sexta-feira, 17 de junho de 2022


17 DE JUNHO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

A AMAZÔNIA ASSASSINADA

O trágico desfecho do episódio de desaparecimento do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips na Amazônia choca o mundo e evidencia, mais uma vez, o descaso histórico do poder público com a região, com a riqueza natural que ela abriga e com seus habitantes originais. Cada vez que defensores da natureza e dos indígenas são assassinados pela brutalidade dos invasores, pela ganância dos criminosos e pela negligência do Estado brasileiro, a própria Amazônia também morre um pouco e o Brasil perde prestígio na comunidade internacional.

Evidentemente, o mais condenável do caso que ainda está sendo investigado pela Polícia Federal é a crueldade que extingue duas vidas humanas e enluta familiares e amigos dos mortos. O mínimo que se espera, diante de tal brutalidade, é uma investigação rigorosa para que todos os responsáveis pelo duplo assassinato, dos executores aos mandantes, sejam devidamente punidos na forma da lei. Nesse contexto, também é imperioso repudiar manifestações concebidas para culpabilizar as próprias vítimas, sejam elas oriundas de autoridades insensíveis ou de cidadãos insensatos. Nada pode justificar a desumanidade cometida.

Infelizmente, o crime do Vale do Javari não é um caso isolado de violência na Amazônia Legal, área correspondente a 61% do território brasileiro e que se estende por nove Estados. A história recente da região de menor densidade demográfica do país registra outros atentados de grande repercussão como os assassinatos da missionária americana Dorothy Stang, em 2005, e do ambientalista Chico Mendes, em 1988, além dezenas de ameaças e execuções de lideranças indígenas, funcionários da Funai e militantes de organizações de defesa do meio ambiente que se opõem à ação de invasores, garimpeiros e desmatadores. O pano de fundo da barbárie é a ausência do Estado.

Os sucessivos organismos oficiais criados para desenvolver e proteger a Amazônia vêm fracassando sistematicamente, sem assegurar amparo social às populações nem conter os impactos ambientais. Considerada uma das últimas grandes reservas de madeira tropical do planeta, a floresta enfrenta um crescente processo de degradação devido à exploração predatória e ilegal de matéria-prima. O desmatamento e a poluição também são causados por atividades legais como a construção de hidrelétricas e a agropecuária extensiva, que depende de enormes extensões de terra. A agricultura e a pecuária, grandes obras de infraestrutura, garimpo e mineração, todas essas atividades provocam impacto na floresta.

Mas é na questão da segurança que o Estado mais falha. Sem vigilância e fiscalização suficientes, organizações criminosas ocupam o lugar do Estado e impõem suas regras perversas à região, invadindo reservas indígenas, promovendo conflitos fundiários e transformando trilhas e povoações em rotas do tráfico de drogas. Os assassinos da Amazônia, estimulados pela impunidade e pela inépcia das autoridades que deviam protegê-la, não hesitam em abater árvores e vidas - como fizeram os executores do indigenista brasileiro e do jornalista estrangeiro em mais um crime hediondo contra a floresta maltratada.

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