sábado, 18 de junho de 2022


18 DE JUNHO DE 2022
CAPA

"Precisamos nos olhar com mais generosidade"

Mônica Martelli elegeu Porto Alegre para a reestreia da peça Minha Vida em Marte, neste final de semana, e conversou com Donna sobre novos projetos, envelhecimento e maternidade

Quando soubemos que Mônica Martelli retornaria à Capital com a peça Minha Vida em Marte e que ela nos daria esta entrevista , ficamos em polvorosa. Com a mesma personalidade intensa, alegre e espontânea que empresta à sua personagem Fernanda no teatro, na série e nos filmes, a atriz falou conosco por telefone e atualizou as novidades aos fãs, ávidos por acompanhá-la novamente após sua saída do programa Saia Justa, do GNT, do qual participou por nove anos.

- Além de retornar aos palcos, que morro de saudade, estou preparando um novo programa de bate-papo e uma série para o streaming - revela.

Em parceria com sua irmã Susana Garcia, ela também escreve um roteiro sobre a vida do humorista Paulo Gustavo. - Era meio pai, meio irmão, me protegia - relembra, saudosa.

Com coragem e liberdade, a carioca de Macaé inspira mulheres de todas as idades ao viver suas vontades - sem medo de testar novas fórmulas e se perguntando: "O que eu quero hoje?".

Aos 51 anos posou nua pela primeira vez, celebrando uma fase "exalando alegria e felicidade". E, aos 54 anos recém-feitos, prioriza a criação da filha, Júlia, de 12 anos, e vive o amor com o empresário Fernando Altério, no qual diz ter "o melhor dos mundos".

- Depois dos 50, você coloca menos responsabilidade na mão do outro para te fazer feliz - reflete.

Como é reencontrar o público porto-alegrense após dois anos e meio de pausa pela pandemia?

Porto Alegre foi a primeira cidade que escolhi para voltar com a peça. Amo me apresentar aqui, tenho uma ligação de muito afeto com essa cidade que sempre me acolhe e recebe de forma carinhosa e respeitosa, que admira meu trabalho e que me entende. Inclusive, já abri sessão extra. É sempre um sucesso. Depois vou a Novo Hamburgo, Curitiba, São Paulo e Nordeste.

A peça mudou?

Ao assistir novamente para retomá-la me surpreendi, achei que faria muitas mudanças. A peça é tão atual, fala de todos os tipos de casamentos sobre o envelhecimento da mulher, a falta de libido, as tentativas de retomar a relação. É atemporal. A protagonista, Fernanda, de 45 anos, narra alegrias e dificuldades do casamento. Vive uma fase em que se sente invisível e tem medo de se separar. Esses e outros dilemas, como falta de tesão e acúmulo de mágoas, ela trabalha na terapia.

Você deixou o Saia Justa neste ano e os fãs ficaram chateados.

Diariamente, recebo mensagens sobre isso. Fui muito feliz sentada naquele sofá por nove anos. Aprendi muito com as pautas e debates. Me entreguei com espontaneidade, histórias e visão de vida. Ali vi o Brasil mudar, o movimento das mulheres se intensificar e avançar.

E quais os próximos projetos?

Fiz um piloto de programa só meu no GNT que se chama "Por Que a Gente é Assim?" (previsão de estreia em 2023) e agora concilio a criação com a agenda dos palcos, que estou com muita saudade e é prioridade. Será um programa de bate-papo, uma das coisas que mais gosto na vida. Além disso, estou escrevendo dois roteiros: uma do meu próprio filme Minha Vida em Marte 2, e outro de uma série para streaming que ainda não posso falar.

Sua história de sucesso inspira muita gente. Você acha que a realização da mulher hoje tem roteiro mais flexível?

Acho que sim. A mulher de 50 não é mais a que faz crochê e frango assado no domingo. Já entendemos que podemos mudar de emprego, marido e cidade. Estamos cada vez mais produtivas e ultrapassando as barreiras do machismo. O envelhecimento da mulher sempre foi visto como algo feio, uma desqualificação, e lutamos contra isso. Desde muito novas somos ensinadas a tomar decisões com pressa. É muito cruel ter que decidir tudo aos 20 anos: o que fazer da vida, a profissão e com quem casar. Ninguém tem maturidade para isso.

E você se cobrava muito?

Fui reconhecida aos 37, mas sofri muito até ali. Desde os 25 anos olhava à minha volta e via as pessoas dando certo nas carreiras e eu, nada. Me cobrava muito. Acho que hoje não tem mais isso. Cada um tem uma história, um tempo, nunca é tarde para nada. Podemos sempre recomeçar. A pior coisa é ter medo de tentar.

Você se considera corajosa?

A coragem não é a ausência de medo, é ir com medo mesmo. E não tenho medo de falhar. A sociedade nos cobra o acerto e, se você pautar sua vida nisso, fica com medo de arriscar. E aí não arrisca uma nova relação, um trabalho, pelo medo do fracasso. E o que é o fracasso? É uma nova experiência, amor.

Que passos você indica às mulheres que querem se reinventar, como sua personagem Fernanda?

O primeiro é desejar, querer muito; o segundo é ter coragem, vá com medo mesmo; e o terceiro, saber que é possível, que não há um único modelo de felicidade e de vida. Temos que testar novas possibilidades, entender o que desejamos, sair dessa prisão que são os formatos que um dia nos disseram que são certos. Não existe certo e errado. A vida oferece muitas possibilidades de felicidade.

Ter posado nua aos 51 ajudou na sua própria revolução?

Foi muito natural, tiro a roupa com facilidade. Mesmo sendo uma mulher dentro de um padrão estipulado, sempre tive questões com meu corpo, como toda mulher. Aprendemos, desde pequenas, a nos olhar no espelho e achar defeitos. Ao contrário dos homens que, aliás, como saiu naquela pesquisa recente: sete em cada 10 se acham bonitos. Se perguntar para as mulheres, sete entre 10 dirão que se acham feias. Também faço parte desse contexto.

Qual sua visão sobre transformações estéticas?

Cada um tem que se entender na própria pele, se ver com generosidade e saber se gostar. Faço tudo para ser uma mulher bonita aos 54 anos. Não posso querer ter 30 e não farei nada que me leve a isso, até porque não tem jeito (risos). Já fiz muitas coisas ligadas à dermatologia, botox, laser, mas com noção. Sempre perguntava ao Paulo Gustavo se tinha ficado bom, porque ele dizia a verdade. Agora peço à minha irmã: ??O dia que eu pirar você me fala, tá???

Você vive um grande amor. Como foi o reencontro?

As relações amorosas sempre ocuparam um lugar muito grande na minha vida, apesar da profissão ocupar um gigantesco. É muito bom se apaixonar aos 50, pois pensava: "se achar uma boa companhia, já está ok. Talvez já tenha vivido as paixões que tinha que viver...". E poder sentir de novo tanta emoção foi um presente. Mas acho que mereço, já sofri muito.

Amor tranquilo é maturidade?

É o desejo de viver isso de novo, é a sorte também - mas é você ajudar essa sorte, né, fazer acontecer. É ótimo, porque somos experientes, com filhos. Já sabemos mais quem a gente é e o que quer do outro, colocamos menos responsabilidade para te fazer feliz.

Moram juntos?

Não, nos vemos toda sexta, sábado e domingo e dá muito certo. No final de semana quero me arrumar para encontrá-lo. A gente se fala o tempo todo, troca opiniões, nos ajudamos, somos parceiros, mas o "massacre" da rotina, não temos. Estamos com o melhor que a relação pode trazer, o melhor dos mundos. Mas não é regra, no futuro pode mudar. Minha prioridade é minha filha, Júlia, que precisa mais de mim. Desejo que ela seja criada na nossa casa, no nosso mundo que amamos. É aquilo: o que desejo hoje?

Como é a relação com sua filha, Júlia?

É maravilhosa: estou entrando na menopausa e ela na puberdade, vamos ter que nos entender dentro dessa casa. Ela com a TPM dela e eu com a minha (risos).

O que você diria sobre a chegada da menopausa?

Não tenha medo dela. É um impacto, mas passa. Lembro da última vez que comprei absorventes e achei que nunca mais passaria por isso. Agora me pego pensando que logo mais estarei comprando novamente, porque minha filha de 12 anos está próxima de menstruar! São ciclos.

Como você vê o atual momento, de muitas possibilidades para as mulheres 50+?

Não temos que ter medo de envelhecer. Poder envelhecer é sorte. Não podemos deixar de fazer mudanças em nossas vidas, apesar da idade, porque viveremos muito ainda. Estamos conquistando cada vez mais espaços. Logo, que seja vivendo da melhor forma, sem arrastar dores e crises por tanto tempo. Pergunte-se "quem sou eu hoje?", "o que eu desejo?". São questões fundamentais saber o que me faz feliz e o que é ter uma vida interessante. 

O escritor Contardo Calligaris que diz: ??Mais que buscar felicidade, temos que buscar uma vida interessante". Se partirmos daí, acharemos caminhos melhores. E não precisam ser grandes revoluções. Pode ser inserir uma aula de ioga na rotina, fazer terapia, um curso. É uma portinha que você abre. E outras vão se abrir. A gente, quando quer mudar, acha que tem que ser uma grande revolução e, na verdade, são pequenas mudanças que podem gerar grandes revoluções nas nossas vidas. 

ADRIANA SIKORA

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