quarta-feira, 20 de dezembro de 2017


20 DE DEZEMBRO DE 2017
PEDRO GONZAGA

O NATAL CASTRO ALVES


E assim chegamos ao coração da temporada do "a pessoa que eu tirei é muito especial para mim: amiga, leal, companheira de loucuras", mesmo que nos seja a mais anônima das criaturas do escritório ou aquele parente distante que vemos bissextamente na ceia familiar. 

E como agravante, como tudo está pela hora da morte, o amigo secreto deste ano terá o limite de trinta dinheiros (quiçá uma homenagem também àquele que por tal soma vendeu o salvador), dificultando, para muitos, a escolha dos presentes, que termina por recair em lembrancinhas engraçadas, por infelicidade sempre mais graciosas para o presenteador. Dirão, certos iluminados, que o importante é o espírito natalino, sim, claro, assim como a paz mundial.

No entanto, esta me parece uma falsa dificuldade, porque com um pouco mais e até muito menos do valor acima é possível encontrar excelentes livros para regalar. Livros? Mas quem quer ganhar livros, os descrentes objetarão. Sim, bom mesmo é ganhar meias e cuecas, quinquilharia chinesas que solucionam problemas que elas mesmas criam. Livros. Livros à mão cheia. Duram uma eternidade. Sempre que reutilizados, revelam novas virtudes. Se não forem do agrado do presenteado, podem ser trocados como roupas, mas com a vantagem, se fechados, de serem solução para um próximo amigo secreto.

Com trinta dinheiros, faz-se a festa no sebo e, com comedimento, também na livraria. Não sabe o gosto do outro, aposte num clássico. Quer surpreender o sorteado, tente um de nossos novos autores. Com mais verba, há as obras de sobrecapa (como antigas sobrecasacas); na penúria, os modestos mas eficazes livros de bolso. 

E não se acanhe com a possibilidade de parecer bizarro por acreditar na literatura. Ela está aí há três mil anos, e era assim, é provável, que os escribas da famosa biblioteca de Alexandria fariam suas trocas de presente, caso lá houvesse Natal, fique dito. Tiveram azar, nasceram muito antes, mas você nasceu no momento certo de começar uma tradição. Dê livros. Seja o bendito de Castro Alves, o daquele famoso poema escolar O Livro e a América:

Oh! Bendito o que semeia

Livros... livros à mão cheia...

E manda o povo pensar!

O livro caindo n?alma

É gérmen - que faz a palma,

É chuva - que faz o mar.

PEDRO GONZAGA