terça-feira, 26 de dezembro de 2017


26 DE DEZEMBRO DE 2017
+ ECONOMIA - FREDERICO TRAJANO - CEO da Magazine Luiza

"Inovação é o grande diferencial na hora da crise"


Ele papou todos os prêmios de gestão em 2017. Sob seu comando desde novembro de 2015, a rede de lojas Magazine Luiza saiu do prejuízo para o maior lucro de sua história no terceiro trimestre deste ano - R$ 92,5 milhões. Foi 273% maior do que o mesmo período do ano passado. As vendas totais cresceram 27% no período. Até o resultado nas mesmas lojas físicas, sem contar novas, aumentou em 15%.

Isso que o forte de Frederico Trajano, ou Fred, como é conhecido, é o e-commerce. Foi o presente de Natal antecipado deste empresário de 40 anos que viveu o outro lado das sucessões familiares: o primeiro homem da linhagem a assumir os negócios, depois da tia Luiza e da mãe, Luiza Helena. Ele diz combinar características femininas e masculinas na gestão. E brinca com as diferenças políticas dele e da mãe, que chegou a ser cotada para ministra no governo Dilma.

Qual o segredo do sucesso?

Trabalhamos muito duro ao longo da crise, cientes de que iríamos passar por muita dificuldade. Quando existe uma crise, é ruim para você e para todo mundo. Se consegue enfrentá-la de maneira inteligente, pode se sobressair, ganhando mercado. O bolo diminuiu, mas você pode pegar uma fatia maior. Muita gente, em contexto de crise, tem agenda meio míope, só cortar custo, reduzir investimento, mandar gente embora. É legítimo para quem está com muita dificuldade e precisa sobreviver. Não critico. Em 2016, reduzimos a base de custos, tivemos de fazer ajustes de funcionários, mas tivemos agenda de inovação também. Muitas empresas deixam de inovar por reduzir investimento, quando, na verdade, inovação é o grande diferencial na hora da crise. Como meus concorrentes não fizeram, estamos abocanhando fatia maior de mercado.

Os cortes foram além na base?

Claro, a liderança tem de dar exemplo. Quem viaja de classe executiva tem de pagar de seu bolso. Cortamos e segue cortado. Se eu viajar de executiva, é porque paguei. Em 2015, ninguém ganhou bônus ou PPR. Ganhamos em 2016 e devemos ter em 2017.

De que tamanho foi a redução de quadro?

Chegamos a ter 24 mil funcionários em 2014 e fechamos com 19 mil em 2016. Nem tudo foi corte, porque há rotatividade muito grande em loja, cerca de 30% ao ano. Fizemos demissões em retaguarda, nos escritórios. Fechou vaga, a reposição era quase proibida. Ainda renegociamos todos os aluguéis, fizemos gestão matricial de despesas. Escolhemos 10 contas - como aluguel, energia elétrica, hora extra, taxa de cartão de crédito, frete - e fizemos força-tarefa. Também saímos de grandes para microtransportadoras. Por outro lado, investimos no e-commerce, no aplicativo de venda, e em tecnologia, que aumenta a venda e diminui custos.

Como foi essa experiência com microtransportadoras?

O e-commerce representou 30% do faturamento no terceiro trimestre. Está em R$ 4 bilhões, alta de 55%. Precisa ótima experiência de compra, tecnologia, mas principalmente entrega. Criamos uma rede de microtransportadoras, a Malha Luiza. Atende lojas físicas e e-commerce. Dei um celular a cada motorista para fazer traking (rastreamento) da mercadoria. Desenvolvemos um aplicativo para transportadores no Luiza Labs. Temos 1,3 mil empresas, em torno de 300 na Região Sul. Digitalizar o Brasil é um dos nossos propósitos. Como marca, queremos ajudar consumidores, parceiros e funcionários a entrar na onda digital. Também estou convertendo as lojas em shoppable distribution center, tornando-as minicentros de distribuição.

A sucessão acabou se tornando uma ascensão da minoria?

(risos) Sou totalmente minoria na empresa. Entre minha mãe e eu, teve um CEO de mercado, Marcelo Silva. Mas sou o primeiro integrante homem da família que assume a companhia. É uma responsabilidade enorme suceder a duas líderes carismáticas, empreendedoras. O conselho tem quatro mulheres, minha mãe cobra muito o empoderamento e está dando exemplo. Desenvolvi um pouco de alma feminina, porque a empresa tem o lado competitivo, que quer crescer e vencer, o masculino, mas tem o feminino de valorizar as pessoas, criar um clima de trabalho de harmonia, ter sensibilidade com a situação específica de cada indivíduo, não cobrar resultados de maneira míope.

Sua mãe foi muito próxima do governo anterior. Vocês têm divergências políticas?

Não, como ela, sou politizado. Nos preocupamos com o Brasil, não só com a empresa. O líder cidadão está mais em voga do que nunca. Aprendi isso com ela. A percepção em relação a minha mãe é um pouco equivocada, porque parece partidarizada, mas foi próxima de todos os governos. Alguns deram mais espaço do que outros. Ela não é radical em nenhuma posição partidária, não é contra a direita nem contra a esquerda, é aberta. Tem muitos empresários que têm rejeição à esquerda, ela não. Gosto desse jeito dela. Confesso que sou um pouco mais liberal, defendo um Estado menor. Ela é de um linha mais intervencionista, mas há respeito mútuo e diálogo produtivo. Debatemos sem esse radicalismo presente na política brasileira.

Você já disse que tem planos para a política. Quais são?

Quando me inscrevi para a faculdade, queria ser político. Era minha intenção original, mas a carreira seguiu para a linha corporativa. Meu foco está voltado para a companhia nos próximos cinco ou 10 anos. Esse sonho antigo pode virar realidade depois.

Magalu é um nome que está pegando. Haverá mudança?

Estou pensando em uma coexistência das duas marcas. A empresa se chama Magazine Luiza, mas pode chamar de Magalu. Estamos colocando Magalu em ofertas, merchandising, ações digitais e, com o tempo, tende a ficar mais importante, mas não vamos matar Magazine Luiza.

O que vê para 2018?

Sem dúvida vai ser um ano muito melhor na economia. É difícil encontrar alguém que não aposte nesse cenário. Mas divido em dois momentos: os primeiros dois trimestres, talvez o terceiro também, depois o quarto. Dependendo da eleição, a recuperação pode ir por água abaixo. Estou superotimista com o primeiro semestre. Existe um risco político não desprezível de entrar uma corrente populista, de esquerda ou de direita, porque para mim uma é tão perigosa quanto a outra. Qualquer visão longe do centro não reformista é perigosa, e esse cenário é provável.

Você tem planos de voltar ao Vale do Silício?

Não precisa ser mudança definitiva, mas quero criar um vínculo, ter um braço do Luiza Labs lá. O Vale hoje é como Paris na época do iluminismo, quando o mundo saiu da Idade Média para a Idade Moderna. E hoje a China é parada obrigatória em inovação no mundo. São dois polos de inspiração.

MARTA SFREDO