terça-feira, 14 de novembro de 2023


14 DE NOVEMBRO DE 2023
NÍLSON SOUZA

Livros proibidos

O governo de Santa Catarina acaba de produzir uma propaganda subliminar imbatível para uma série de livros que provavelmente muitos estudantes jamais leriam. Ao anunciar uma lista de obras literárias que devem ser banidas das escolas públicas daquele Estado, a "autoridade" certamente acionou no cérebro dos jovens o chamado "gatilho fruto proibido", aquele que desperta nossa curiosidade de conhecer tudo o que alguém tenta ocultar de nós. O ser humano veio equipado com o chip do livre-arbítrio, por isso reage quase que instintivamente a proibições e imposições que ameacem suas liberdades.

Proibir é o mesmo que provocar, especialmente nestes tempos digitais em que todos têm acesso a tudo. Que resultado prático pode ter uma censura desse tipo quando se sabe que crianças e adolescentes acessam facilmente conteúdos bem mais contundentes na internet? Os censores parecem ignorar que alguns títulos vetados já viraram filmes - e que muitos estudantes já devem tê-los visto.

O que se pode concluir, então, é que a referida proibição talvez tenha outros propósitos, como o de marcar uma posição política simpática ao eleitorado mais conservador. Seja qual for a sua motivação, porém, tem potencial para provocar um dano talvez maior do que o suposto benefício moral, pois contribui para desestimular a leitura num momento em que está cada vez mais difícil convencer o público jovem a ler textos mais elaborados do que as mensagens apocopadas da internet.

Educar para o discernimento é muito mais sensato e produtivo do que proibir a leitura de qualquer coisa. Creio que é isso que as famílias, os governantes e as escolas deveriam priorizar. Dá trabalho, mas o ideal é capacitar crianças e adolescentes para que façam suas próprias escolhas e aprendam a separar o joio do trigo, tanto no mundo digital quanto no analógico. Em vez de banir o livro da biblioteca, quem sabe informar que ele existe e debater seu conteúdo à luz de múltiplas visões.

Não somos avestruzes. Se realmente queremos proteger nossos jovens dos perigos da vida, precisamos habilitá-los para o enfrentamento. Duvido que qualquer dos livros banidos contenha algo mais danoso do que uma proibição que sugere a solução de problemas pela via autoritária. Se as autoridades catarinenses visitassem a nossa Feira do Livro, que encerra brilhantemente sua 69ª edição amanhã, talvez percebessem que quem lê sabe o caminho - e que a censura é sempre um passo na direção da tirania.

NÍLSON SOUZA

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