terça-feira, 21 de novembro de 2023


21 DE NOVEMBRO DE 2023
NÍLSON SOUZA

A menina da raiz quadrada

Minha compra na padaria totalizou R$ 23. Perguntei à moça do caixa se podia pagar com moeda sonante. Ela me olhou desconfiada, como se eu a estivesse submetendo a uma pegadinha. E estava mesmo. Sustentei o olhar sem dizer mais nada para induzi-la a falar o que eu já sabia que ia ouvir:

- O que é isso? - questionou.

Dinheiro, moça! Dinheiro vivo, ainda que nossas notas e moedas pareçam condenadas à morte pelo próprio Banco Central, que já cogita a criação de um mecanismo digital para sepultar também os cartões de débito e crédito. Em tempos de Pix e criptomoedas, o dinheiro físico começa a ser visto com desconfiança - e, às vezes, até com repugnância. Já vi gente passando álcool nas mãos depois de pegar uma cédula com a ponta dos dedos.

Pensei em explicar à minha interlocutora que o termo sonante vem de uma época antiga em que as transações financeiras eram legitimadas por moedas metálicas, especialmente de ouro e prata. Lançadas sobre um balcão ou uma mesa, ouvia-se o tilintar que assegurava a pureza do metal utilizado. Sonante, portanto, deriva daquele som inconfundível para os comerciantes pretéritos.

Desisti da explicação. Simplesmente peguei uma cédula de R$ 50 e paguei minha conta, pois precisava de troco para o pedágio. Sei, também pode ser pago com cartão, Pix ou aplicativo, mas acho mais rápido com dinheiro. A jovem da padaria pegou uma máquina de calcular. Perguntei-lhe se queria R$ 3 em moedas, para facilitar o troco. Recusou:

- Aí vai ficar ainda mais confuso - me disse com sinceridade.

Tudo bem. Acabou me devolvendo uma nota de R$ 20 e sete moedas, que deixaram bem feliz o homem do pedágio. Mas fiquei intrigado: máquina de calcular para saber quanto é 50 menos 23? E não é incomum isso. Outro dia, já contei aqui, a moça da feira orgânica também se confundiu com um troco elementar e foi logo se justificando:

- Sou das humanas!

Pois neste contexto de desamor à matemática, comprovado e confirmado por sucessivas avaliações oficiais, que chegam a registrar 95% de estudantes com conhecimento insuficiente da disciplina ao final do Ensino Básico, de vez em quando surge uma surpresa no país. Há poucos dias, uma menina mineira de apenas 11 anos descobriu um novo jeito de calcular a raiz quadrada. Seu método simples, sem máquina de calcular, foi reconhecido como original e eficiente até por uma revista científica estrangeira.

Dificuldade para somar e diminuir, mas facilidade para raiz quadrada: o Brasil não é mesmo para amadores.

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