sexta-feira, 17 de novembro de 2023


17 DE NOVEMBRO DE 2023
CELSO LOUREIRO CHAVES

Um livro que se lê com prazer

Mesmo que a Feira do Livro já tenha terminado, sempre é tempo de recomendar livros de música. O mercado desse tipo de literatura nunca foi muito aquecido no Brasil, então, se algo como Notas em Pauta, da pianista Olinda Allessandrini, atravessa nosso caminho, é pegar ou largar. No caso, é livro para pegar e ler logo, pois Olinda tem muito a nos contar.

Temos uma história em comum, Olinda e eu. Fomos alunos do mesmo professor, o grande Milton de Lemos, mestre do piano aqui e em Pelotas. Personalidade de não esquecer e, para quem iniciava no piano como eu, modelo formador de ética e música. Olinda estava quilômetros adiante de mim em refinamento técnico e maturidade musical, já era pianista completa. Eu ainda não chegara à idade adulta musical.

Há pianistas escritores e, com Notas em Pauta, Olinda Allessandrini se une a eles, como Stephen Hough ou Alfred Brendel. São os nomes que me vêm à memória, depois de percorrer mais uma vez o livro de Olinda. Há muito para ler: são histórias interessantes, capítulos curtos, ilustrações fartas. É fácil ir passando de uma página a outra, sempre pensando no que está por vir, sempre refletindo sobre o que ela já nos contou com sua mão firme de narradora.

Notas em Pauta começa longe, no tempo e nas geografias, e pouco a pouco vai se aproximando de nós, até chegar ao capítulo "O piano encontra o pampa", que remete a um dos álbuns incomparáveis de Olinda, pamPiano, com compositores e compositoras da terra e que também é parceria de vídeo com Caio Amon, disponível no YouTube. É a cereja do bolo: o livro de Olinda tem a possibilidade de trilha sonora simultânea, tocada por ela mesma.

Começando em Bach e Händel, os capítulos vão avançando na cronologia para comentar duplas e trios que, às vezes, são encontros explosivos (Tchaikovsky e sua patrocinadora Von Meck), às vezes relações ainda não esclarecidas (Brahms e o casal Clara e Robert Schumann). E vamos chegando à música brasileira por via de Alberto Nepomuceno, precursor de certa brasilidade em música.

De repente estamos na belle époque de Porto Alegre, prontos para a estreia da ópera Carmela de Araújo Vianna - hora também de ouvir o álbum em que Olinda resgatou a música dele, esquecida há muito. E vem Radamés Gnattali, num capítulo delicioso que envolve Getúlio Vargas e suas promessas nunca cumpridas. Notas em Pauta de Olinda Allessandrini é mesmo um livro que se lê com prazer. Assim fica a sugestão. Não importa que a Feira do Livro tenha terminado, pois sempre é tempo de música e boas leituras.

CELSO LOUREIRO CHAVES

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