
Soft power
O cientista político que desenvolveu o conceito de "soft power" e o homem que se tornou a própria encarnação da liderança exercida pela força do exemplo morreram com intervalo de poucos dias, e quase a mesma idade, na primeira quinzena deste mês de maio.
Professor emérito de Harvard e decano da ciência política norte-americana, Joseph Nye Jr. (1937-2025) cunhou o termo "soft power" enquanto escrevia Bound to Lead: The Changing Nature of American Power ("Destinado a liderar: a natureza mutável do poder americano"), lançado em 1990. Em oposição ao poder imposto pela força das armas, da coerção e da chantagem econômica, o "soft power" é sustentado pelo estilo de vida que projeta.
O viajante brasileiro que já recebeu um sorriso caloroso ao mencionar sua nacionalidade sabe que o futebol, a música e a natureza são reconhecidos, em qualquer lugar, como nosso "poder suave". No caso dos Estados Unidos, apontou Nye, colocar-se ao lado da democracia, dos direitos humanos e da cooperação entre as nações, com apoio de uma rede de organizações governamentais espalhadas pelo mundo e da exportação do "american way of life" através da cultura, tornava o país mais forte e mais influente.
Não é exagero dizer que Pepe Mujica (1935-2025) não apenas ajudou a reinventar o "soft power" uruguaio como confundia-se com ele. Foi na qualidade de defensor da justiça, da ciência, da cooperação entre os países, das políticas públicas voltadas para o bem comum e de um estilo de vida menos consumista e mais sustentável que Mujica fez um discurso histórico na ONU em 2013: "Nem os grandes Estados nem as transnacionais e muito menos o sistema financeiro deveriam governar o mundo humano, mas sim a política entrelaçada com a sabedoria científica. Ali está a fonte".
Como homem, como político e como pensador, Pepe Mujica era o antípoda perfeito de Donald Trump. Joseph Nye, por sua vez, não poderia discordar mais da maneira como o atual presidente norte-americano tem tratado a imagem externa do país. Em um artigo publicado postumamente, Nye escreveu que Trump nunca conseguiu entender o conceito de "soft power" e está enfraquecendo os Estados Unidos em vez de torná-lo "grande de novo".
Ainda assim, Nye manteve até o fim o que ele definia como um "otimismo cauteloso". Por ter vivido muito e visto a História esfriar e esquentar, apertar e afrouxar, ele confiava em um futuro mais "soft". Quem sabe um pouco mais perto dos sonhos de Pepe Mujica do que da ganância predatória de Donald Trump. _
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