sábado, 30 de maio de 2020


30 DE MAIO DE 2020
FLÁVIO TAVARES

A BOIADA

É comum confundir estupidez com rudeza ou grosseria, quando, de fato, é muito mais do que isto. É imensa teia que aprisiona e afoga a todos, incluído o estúpido.

Em As Leis Fundamentais da Estupidez Humana, o pensador italiano Carlo Cipolla apontou cinco situações: 1) subestimamos o número de estúpidos; 2) o estúpido nunca é só estúpido e tem outras torpezas; 3) o estúpido nem sequer tira proveito da estupidez e pode, até, prejudicar-se com ela; 4) os não estúpidos desvalorizam o potencial nocivo dos estúpidos; 5) em suma, o estúpido é a pessoa mais perigosa e destrutiva que existe.

No vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, os cinco monstros da estupidez apareceram de uma só vez, capitaneados pelo presidente da República. E não como crítica à estupidez em si, mas como se fosse a disputa de um grotesco torneio do absurdo. A pandemia da covid-19 já estava no apogeu, mas não surgiu sequer uma simples ideia para combatê-la.

A única menção (apenas menção) à pandemia foi feita pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ao sugerir que (já que a imprensa está dedicada à covid-19) o governo deveria aproveitar a situação "para passar a boiada" e, assim, simplificar as leis de proteção à natureza.

Num evidente "ato falho", impossível de ocultar, Salles chamou de "boiada" o conjunto de medidas que preparou para se autotransformar, cada vez mais, no "ministro do desmatamento". Citou como "modelo" as medidas que facilitam arrasar o que ainda resta da Mata Atlântica, seus córregos e cachoeiras.

Não só a natureza e o meio ambiente foram alvo do tiroteio. Quase todos imitaram o palavreado chulo (ou obsceno) do presidente da República. Até o ministro da Economia, Paulo Guedes, usou o verbo predileto de Bolsonaro e, ao defender a liberação de cassinos e jogos de azar, pediu à ministra Damares, dos Direitos Humanos: "Deixa cada um se f.... do jeito que quiser, principalmente se o cara é maior, vacinado e bilionário".

Parecia, até, uma desatinada conversa gerada por litros de cachaça em estômago vazio, em que só se fale em passar a boiada?

Pela segunda vez, Rio Pardo se torna "cidade histórica", mas, agora, pelo horror do roubo (mais de R$ 15 milhões) organizado pelo prefeito sob o torpe simulacro de enfrentar a pandemia. A prisão do prefeito e seus asseclas mostra que o Rio Grande já não é uma ilhota isolada no mar da corrupção que assola o país.

Aqui, também, fomos carcomido$ pelo víru$ ance$tral que, no Rio de Janeiro, leva a Polícia Federal a investigar até o governador estadual, além de um filho do presidente da República. E de imediato, antes que a boiada passe, pois, aí, a avalanche destruirá o essencial, legalizando o crime maior.

Jornalista e escritor - FLÁVIO TAVARES

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