sábado, 16 de maio de 2020



16 DE MAIO DE 2020
J.J. CAMARGO

A DAMA DA LÂMPADA

Nesta semana, há exatos 200 anos, nascia, na Itália, Florence Nightingale, filha do milionário inglês William Shore Nightingale, que vivia então em Florença.

De volta a Londres, ela teve uma educação primorosa no King?s College e se encaminhava para ser mais uma donzela deslumbrada, reprisando as filhas de famílias ricas da Inglaterra vitoriana. No entanto, como para provar que muitas vezes o destino quebra projetos, em uma viagem ao Egito, visitando hospitais, ela teve despertada a sua vocação para a enfermagem, apesar de, à época, não ser reconhecida como uma atividade digna. No século 19, os hospitais funcionavam como albergues que recolhiam os miseráveis que adoeciam, enquanto os ricos eram tratados em suas próprias casas, para onde acorriam os médicos chamados para atendê-los.

Foi nesse universo de máxima degradação humana, que Florence mergulhou e descobriu o quanto podia ser feito, além de simplesmente lamentar a má sorte dos desprotegidos. Criou uma escola de enfermagem no Saint Thomas Hospital, em Londres, que lhe abriu as portas para ser considerada, na posteridade, a mãe da enfermagem moderna. A grande guinada na sua vida ocorreu quando, aos 33 anos, se inscreveu como voluntária para cuidar dos feridos da Guerra da Crimeia, um conflito em que a Inglaterra e a França decidiram apoiar a Turquia, contra a ambição de expansionismo ilimitado da Rússia, e que, em três anos, resultou em milhares de mortos e feridos graves.

Com um grupo selecionado de 38 voluntárias, Florence liderou uma política de assistência que priorizava higiene máxima e alimentação adequada dos feridos. Apaixonada por matemática e com noções de estatística, demonstrou que, com esses cuidados básicos, era possível reduzir para 3% uma mortalidade que oscilava em torno de 40%.

As notícias que vinham do front davam conta do seu heroísmo e, na Inglaterra pós-guerra, foi considerada a segunda pessoa mais famosa, atrás apenas da Rainha Vitória, que lhe agraciou, anos depois, com a maior comenda nacional, a Ordem do Mérito. Numa publicação do final do século 20, Florence foi incluída na lista das 100 mulheres que mais contribuíram para moldar a história da humanidade.(Rolka, 1994). Num pequeno e delicioso manual, ela escreveu: "Toda mulher, um dia, cuidou de uma criança doente ou de um desvalido. Toda mulher, um dia foi, ou será, enfermeira".

Sua biografia confirmou que quem cuida de gente não se destaca apenas pela fita métrica da competência. Florence fez dessa maravilhosa profissão a apologia da generosidade e do afeto, sempre disponíveis, como quando percorria, tarde da noite, as enfermarias dos hospitais para uma última palavra de consolo, o que lhe rendeu o título de a Dama da Lâmpada. O tempo passou, os hospitais se informatizaram, os visores coloridos brilham nas salas de prescrição, mas o reconhecimento dos pacientes acarinhados nunca mudou.

É compromisso da gratidão manter acesa a lâmpada que ela carregava. Enquanto houver quem precise ser socorrido.

J.J. CAMARGO

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