sábado, 26 de dezembro de 2015



26 de dezembro de 2015 | N° 18396 
CLÁUDIA LAITANO

Sem remédio


É perturbador constatar que boa parte dos adultos em volta, especialmente os mais jovens, conhece os nomes de todos os ansiolíticos e antidepressivos disponíveis no mercado. Sim, remédios muitas vezes são necessários e que bom que eles existem e são hoje mais eficientes e seguros do que há 15 ou 20 anos. Ainda assim, a explosão de consumo dos últimos anos sugere que talvez psicofármacos não estejam tratando apenas doenças ou momentos de fragilidade psicológica, mas expectativas nem sempre muito realistas a respeito do que seja a vida adulta, com seus altos e baixos inevitáveis. 

Aparentemente, estamos perdendo a paciência e a resiliência com os problemas cotidianos, e os remédios se apresentam como uma alternativa rápida e indolor para resolver o que em outros tempos talvez fosse tratado como uma circunstância adversa passageira e não como uma doença.

Quando estamos falando de adultos que decidem que o caminho da medicação é a melhor alternativa, podemos assumir que a escolha foi baseada em informações e que os prós e contras foram pesados. O quadro muda bastante quando os pacientes são crianças e adolescentes, que ainda não têm condições de decidir sozinhos como sua agitação, sua dificuldade para aprender ou qualquer outro traço de comportamento considerado fora do padrão será tratado – ou não.

Um estudo realizado na Holanda, em 2009, concluiu que 34% das crianças com idades entre cinco e 15 anos eram tratadas por hiperatividade e déficit de atenção. O psiquiatra americano Allen Frances, autor do livro Saving Normal (salvando o normal) e crítico da chamada “medicalização da vida cotidiana”, afirma que a incidência real do problema deve ficar em torno de 2% a 3% da população infantil. Mesmo assim, cerca de 11% das crianças americanas são diagnosticadas como hiperativas ou com déficit de atenção – 20% no caso dos adolescentes homens, metade deles tratada com fármacos. 

Outro dado impressionante mencionado pelo psiquiatra que durante anos dirigiu o Manual Diagnóstico e Estatístico (DSM), documento que descreve e tipifica as diferentes doenças mentais: entre as crianças em tratamento psiquiátrico nos Estados Unidos, mais de 10 mil têm menos de três anos. No Brasil, a situação não é muito melhor. Em 10 anos, entre 2003 e 2012, o consumo de ritalina aumentou quase 775% no país, e especialistas têm sugerido que os médicos podem estar receitando o remédio sem toda a investigação necessária.

Por esse motivo, é muito bem-vinda a notícia de que o Conselho Nacional de Direitos da Criança publicou uma resolução, na semana passada, recomendando o fim da prescrição excessiva de medicamentos para crianças e adolescentes. O documento defende que os jovens têm direito a diferentes alternativas de tratamento – inclusive nenhum, já que nem toda criança agitada ou desobediente deve ser medicada.

Para a maioria, tempo, disponibilidade e paciência dos pais resolve a maior parte dos problemas.