domingo, 26 de agosto de 2018


25 DE AGOSTO DE 2018
DAVID COIMBRA

O Melhor Bar da História de Porto Alegre

Qual o melhor bar da história de Porto Alegre?

Tenho discutido essa candente questão com os amigos. Estou pensando até em organizar uma eleição. Claro, muitos dos critérios de análise serão pessoais e de natureza afetiva. Mas as escolhas são sempre assim, não é mesmo? Porém, ah, porém, tento ser justo. Provarei o quanto, apresentando outros de meus campeões, em outros setores da vida. Por exemplo, na música:

Melhor intérprete do Brasil - Roberto Carlos.

Melhor voz masculina - Tim Maia.

Melhor voz feminina - Elis Regina.

Melhor letrista - Chico Buarque, empatado com Noel Rosa.

Melhor poeta - Belchior empatado com Caetano Veloso.

Melhor sambista - Paulinho da Viola.

Melhor músico, o melhor de todos, o campeão dos campeões - Tom Jobim.

Você pode não ter concordado comigo em alguns pontos, mas repare que houve reflexão na minha eleição. Coerência, entendeu? E assim procederei para escolher O Melhor Bar da História de Porto Alegre.

Um dos critérios pessoais que pesam na avaliação é: bares em que você se deu bem, emocionalmente falando. No meu caso, destacaria o velho Doctor Jekyll, que ficava ali no Largo da Epatur. A música era ótima, só clássicos do rock?n?roll, e lá eu demonstrava por que era chamado de "O John Travolta do IAPI".

Havia uma cabeça de onça empalhada pendurada numa das paredes. O Professor Juninho se posicionava bem debaixo daquela onça, sempre com uma garrafinha de cerveja na mão. Por algum motivo, as mulheres olhavam para a onça, depois olhavam para o Juninho, de novo para a onça e mais uma vez para o Juninho. Neste instante, ele investia. Rosnava, um onço:

- Grrrau!

Elas estremeciam.

Uma noite, eu mesmo estava parado debaixo da onça e chegou uma morena e me disse, sem nem se apresentar:

- Vamos sair daqui agora!

Saí.

Ah, o velho Doctor Jekyll está na minha lista.

Outro que já fechou, e por enquanto falarei só nos que já fecharam, outro era o Espaço IAB. Nós íamos lá todas as quintas-feiras, eu, meu irmão Régis, o Zini, o Ricardo Carle, o Cyro Martins, o Sérgio Lüdtke.

O Zini havia voltado recentemente de Londres, onde vivera por três anos. Naquela época, as pessoas não viajavam tanto como agora. Então, quando o Zini começava a conversar com alguma moça interessante, era sempre esse o engate do assunto. Ele comentava casualmente:

- No tempo em que vivi em Londres, não era assim?

Ela se admirava:

- Tu viveu em Londres???

Ele, modesto:

- Pois é?

Houve também a Calçada da Fama, que não era um bar, era um complexo de bares. No princípio, nada existia naquele lugar. Tudo era ermo e sombrio, quando não turvo. A Fernando Gomes não passava de uma rua pacata e arborizada, com algumas poucas casas do lado direito e as costas do Dmae do lado esquerdo. Então, o Dirceu Russi abriu o Jazz Café e o Ricardo Carle nos convocou:

- Vamos lá prestigiar o Dirceu e sorver alguns drinques?

Foi o que fizemos. E o Jazz começou a fazer bom sucesso e logo um novo bar, o Lilliput, resolveu abrir uma filial bem ao lado. O Dirceu se inquietou, pensou que teria de dividir seus clientes, mas foi o contrário: a saudável concorrência os multiplicou e, assim, outros bares vieram e outros e mais outros, até que, num 8 de janeiro de 1997, aniversário do Professor Juninho, protagonizamos a célebre Noite dos 600 Chopes.

Ainda estou estudando os bares que incluirei na minha lista. Aguardo contribuições. Por ora, citarei mais um, o desconhecido Bar do Chico, que ficava debaixo do Viaduto Obirici, ao lado da Barbearia Gre-Nal, onde cortávamos cabelo lendo antigas edições da revista Placar. Não havia nada de especial naquele bar, a não ser o mais importante: tratava-se da cerveja mais gelada da cidade. Vinha para a mesa branquinha de neve por fora, no ponto exato antes do congelamento.

Uma noite, estávamos no Bar do Chico e, numa mesa mais afastada, acomodou-se o Ronaldo, nosso amigo do IAPI. O Ronaldo sabia brigar. Ele era frio. Ele jamais se enervava. Apenas olhava para a cara do adversário, enquanto usava os punhos para transformá-la em um xis-bacon com ovo. Nessa noite, quatro sujeitos de uma mesa próxima começaram a discutir com ele.

- Nós somos da polícia! - avisou um.

A resposta do Ronaldo:

- Bem feito. Se tivessem estudado, seriam arquitetos.

Eles se levantaram para brigar. O Ronaldo se levantou. Eu e os outros nos levantamos e nos homiziamos atrás do balcão. Sabíamos o que aconteceria. Aconteceu: o Ronaldo transformou as caras deles em xis-bacon com ovo. E quebrou o bar todinho.

Quanta história nos grandes bares de Porto Alegre!
DAVID COIMBRA