segunda-feira, 26 de março de 2018


26 DE MARÇO DE 2018
DAVID COIMBRA

O que significa o ódio ao "cidadão de bem"


Virou moda, no Brasil, criticar o "cidadão de bem". Funciona assim: quando um dos nossos Guevaras caboclos quer dar aparência de contestador da sociedade hipócrita, isto é, quando quer parecer melhor do que os outros, ele cita ironicamente o "cidadão de bem" como apoiador de alguma proposta reacionária ou, pior, do governo Temer. A ideia é dizer que, na verdade, o cidadão de bem não existe, porque seu pensamento é do mal.

Só que o cidadão de bem existe, sim. Ele é o sujeito que não tem muitos outros interesses além de trabalhar, cuidar da sua família e divertir-se com seus amigos. É quem gasta em dobro para ter serviços que deveriam ser prestados pelo Estado. Quem paga os impostos que, quase sempre, sustentam os que o criticam.

Para os Guevaras de Smartphone, o cidadão de bem vestiu camisa amarela, empunhou a bandeira do Brasil e bateu panelas para colocar Temer no poder. Errado. O cidadão de bem fez isso para tirar o PT do poder. Quem colocou Temer no poder foi o PT. Temer e seus amigos sempre foram aliados do PT. Hoje, os petistas tentam passar a ideia de que Temer e seus amigos eram a pior parte do governo do PT. Errado de novo. A pior parte do governo do PT era o PT.

Provo. Lembre-se do que ocorreu dias atrás, na bizarra caravana de Lula pelo Rio Grande do Sul. Lula chamou os produtores rurais de caloteiros e disse que, nas estâncias, os cavalos são mais bem tratados do que os trabalhadores. Também isso não é verdade. Foram divulgados dados do Banco Central mostrando que o crédito rural tem as menores taxas de inadimplência do país. Quanto à situação dos trabalhadores do campo, conheço alguns, e eles vivem em melhores condições do que os que moram na cidade.

Mas esse é um aspecto secundário. O importante é a essência do discurso de Lula, que é a mesma que a dos que falam mal do cidadão de bem. O pensamento subjacente é de que o brasileiro da classe média e da classe alta odeia o brasileiro da classe baixa. Mais: o brasileiro da classe baixa só está lá embaixo por causa dos que estão na média e na alta - aquele que consegue ganhar um pouco mais só ganha um pouco mais porque outros ganham muito menos. É um raciocínio do século 19: a riqueza de um país é um bloco mineral, sólido e morto, jamais crescerá. Logo, se alguém tem mais do bloco, outros têm menos. E, para quem tem menos, qual é a proteção? A única proteção? O PT e seu messias, Lula. São eles, com a doce bajulação dos Guevarinhas, que vão tirar dos ricos para dar aos pobres.

Com essa filosofia rudimentar, Lula não tenta se eleger. Ele sabe que não se elegerá, ainda que o STF confirme o golpe que prepara contra a justiça e o livre da punição. Lula queimou suas pontes. A ofensa aos produtores rurais e as fartas ameaças que fez em seus discursos demonstram isso. Lula, agora, só quer escapar da cadeia. E o PT, partido que abriga tanta gente séria e honesta, partido que um dia foi de fato propositivo, tornou-se apenas um triste relho de caudilho. Um partido que tem dono.

O destino de Lula e o do PT, porém, são menos importantes. O importante é o efeito que esse movimento está gerando. No passado, foi esse preconceito dos Guevaras caboclos contra o cidadão de bem que fundou o ódio ao PT e expurgou o partido do poder. No presente, esse pensamento, cevado em cada frase de Lula e de seus aduladores, está radicalizando ainda mais a sociedade brasileira. No futuro, um futuro não muito distante, quem se posicionar no outro extremo levará vantagem. E virá o Apocalipse. Bolsonaro será eleito presidente do Brasil.

DAVID COIMBRA